Série de sermões expositivos sobre o livro de Ester. Sermão Nº 01 –  O império da assimilação. Ester 1:1-11. Pregação do Pastor Jairo Carvalho em 23/09/2020.

INTRODUÇÃO

Imagine passar a vida se equilibrando numa corda bamba, num mundo hostil, ao mesmo tempo em que tenta realizar uma tarefa difícil.

Essa é a metáfora que domina a peça clássica, “Um violinista no telhado”. encenada na Broadway pela primeira vez em 1964 e foi apresentada em 2012 na cidade de São Paulo com elenco de peso.

O personagem principal, o judeu russo Tevye, interpretado por Jose Mayer, explica sua vida nestes termos:

Um violinista no telhado — isso soa estranho, não é mesmo? Mas aqui na nossa pequena vila de Anatevka você pode dizer que cada um de nós é um violinista no telhado, tentamos tocar um simples e agradável acorde sem quebrar o pescoço.

Não é fácil. Talvez você possa perguntar: por que ficamos lá no alto, se é tão perigoso? Bem, nós ficamos porque Anatevka é nosso lar. E como mantemos o equilíbrio? Posso responder com uma palavra: tradição.

  1. A PRESSÃO DO IMPÉRIO.

A imagem do “violinista no telhado” se aplica aos judeus na Pérsia no tempo de Ester do mesmo modo que se aplica aos judeus russos do início do século 20, como também nós cristãos.

  1. Cultura pluralista.

O povo de Deus não era semelhante àqueles que viviam ao seu redor e sabiam que não podiam confiar nos seus governantes.

Os persas tinham todo o poder e os judeus nenhum. Ainda que esses judeus tivessem nascido na Pérsia, eles eram exilados que estavam longe de sua terra natal, cercados por estranhos.

Podiam ter sua propriedade confiscada ou até perder a vida por causa do capricho de algum burocrata insignificante.

Por outro lado, se a sorte lhes sorrisse, eles poderiam sobreviver até uma idade avançada e viver uma vida bastante confortável.

Como disse Tevye, “não é fácil […] mas é nosso lar”. Numa situação tão difícil, por que os judeus se arriscavam a viver a vida de uma maneira diferente?

Porque ele era um povo, que tem leis e costumes, diferentes de todos os outros povos, seus inimigos eram intolerantes.

Por que não se conformar às exigências do império, ASSIMILAR A CULTURA e se tornar invisíveis? Invertendo o ditado japonês: “Prego que não sobressai dificilmente será martelado”.

Mas está certo dizer: “se a sorte lhes sorrisse […]?”. Não havia um Deus no céu, um Deus que havia se comprometido com o povo judeu numa antiga aliança?

Ele não cuidou dos pais deles quando eram estrangeiros numa terra que não era deles? Ele não os tirou do Egito com mão forte e braço poderoso? Ele não cuidaria do seu próprio povo mesmo em meio às trevas desse momento?

Afinal, muito tempo havia se passado desde a maravilhosa história do povo atravessando o mar Vermelho.

Por que ele se importaria lá, das alturas, olhando para pessoas comuns lutando para sobreviver na distante Pérsia?

Eles não conseguiam ver esse Deus, não tinham tido notícias dele ultimamente e de qualquer modo, estavam a quilômetros de distância da terra que chamavam de sua.

Será que esse Deus invisível ainda tinha o que era preciso – em termos de poder e interesse – para chegar a eles e tocar a vida deles?

Quando pensamos sobre isso nesses termos, fica claro que a situação do judeu Russo Tevye e a de Ester não está tão distante da nossa realidade quanto poderíamos a princípio ter imaginado.

Podemos não sofrer perseguição direta por causa de nossa nacionalidade ou fé, embora, em diversas partes do mundo seja essa a realidade de muitos do povo de Deus.

Contudo, nós somos estrangeiros na terra em que vivemos, chamados para estar no mundo, mas não somos do mundo.

Podemos ser cidadãos do país em que vivemos, ainda que num sentido profundo estejamos sujeitos a um rei diferente, com lealdades e comprometimentos diferentes dos nossos compatriotas.

Às vezes essa diferença não parece particularmente importante. Todos fazemos parte da mesma comunidade.

No entanto, outras vezes torna-se DOLOROSAMENTE EVIDENTE que não estamos operando sob a mesma administração que os que vivem ao nosso redor.

Numa sociedade PLURALISTA, também lutamos para manter nossa lealdade a Cristo que vem em primeiro lugar.

Vivemos em meio a uma CULTURA que constantemente martela aqueles que se levantam em favor da verdade. Não é fácil – mas esse é o nosso lar.

  1. A invisibilidade divina.

Mais do que isso, a INVISIBILIDADE DE DEUS é uma dificuldade para nós também.

Na nossa experiência, o Deus que pôde abrir o mar Vermelho e ressuscitar Jesus de entre os mortos escolhe não exercer o mesmo poder com muita frequência.

Lutamos quando os objetivos e sonhos que tínhamos para nossa vida são esmagados pelas circunstancias, embora talvez eles fossem sonhos bons e piedosos que Deus poderia facilmente tornar realidade.

O judeu russo Tevye sonhava ser rico e se perguntava quais ESQUEMAS CÓSMICOS teriam sido arruinados se Deus lhe tivesse dado uma vida melhor.

Ele tinha cinco filhas, que não se casava, por que ele não podia dar um bom dote, e então elas não arrumavam casamento. Ele tinha um único cavalo, que era manco e por isso tinha que puxar a carroça sozinho.

E Talvez isso tem sido tudo o que sempre quisemos; ter um casamento feliz, ou filhos, ou criar bem esses filhos, mas Deus não realizou esses sonhos.

Talvez o desejo de nosso coração fosse servir a Deus num ministério de tempo integral, ou ver nosso amigo mais querido se render a Jesus, mas isso nunca aconteceu.

Clamamos a Deus, perguntando que ESQUEMA CÓSMICO seria prejudicado se nossas orações fossem atendidas, mas não há resposta. Deus permanece escondido, sua vontade inescrutável.

Como os judeus do tempo de Ester e os judeus russos da diáspora, podemos descobrir que somos “violinistas no telhado”, lutando desesperadamente para encontrar o equilíbrio num mundo confuso e opositor.

  1. ASSIMILAÇÃO E DESESPERO

Podemos nos relacionar, então, às duas primeiras tentações que os judeus enfrentaram nos dias de Ester.

  1. Assimilação:

Por um lado, o poder do império pagão era extremamente visível e concreto.

Eles o ouviam diariamente no som da marcha dos soldados e no ruído das carruagens. Eles viam a sua abundante riqueza e o controle absoluto dos detalhes da vida.

Eles sentiam o cheiro de seu poder no incenso oferecido na centena de templos pagãos, por toda parte, financiados pelo Estado.

Por que não desistir do lema “Nós somos o povo da aliança com Deus” e se juntar à multidão? E aproveitar os grandes banquetes?

Esse era o alvo do império persa. Oferecer todo poder e gloria aqueles que assimilassem a cultura.

Na famosa série de ficção científica “A jornada nas Estrelas: A nova geração”. os “Borg”, organismos cibernéticos que tinham uma mente coletiva; eram os mais detestáveis inimigos da Federação.

Seu modo de agir era fazer com que seus inimigos fossem incorporados na coletividade e extrair deles tudo o que fosse de valor.

Os Borg se tornaram um símbolo na “cultura popular” como um rolo compressor contra o qual “a resistência é inútil”. O lema deles era: “A RESISTÊNCIA É INÚTIL; VOCÊ DEVE SER ASSIMILADO”.

Exatamente desse mesmo modo, o império persa buscava transformar os vários povos que habitavam seu território numa única MASSA UNIFORME.

A pressão por se “conforma” tornava a tentação ainda maior porque muitos cativos e exilados já haviam Partido com Zorobabel; e voltado para Jerusalém, no tempo do decreto de Ciro em 538 a.C, e depois com Esdras.

Agora, mais de cinquenta anos depois do acontecimento, aqueles que permaneceram em Susã, a capital persa, a cidade mais rica e bonita da época.

Eles eram fortemente tentados a se acomodar a uma coexistência confortável, num império com 50 milhões de pessoas.

O cativeiro havia sido bom para eles, e muitos judeus, não queriam voltar para reconstruir Jerusalém do zero em meio a pobreza e destroços.

Eles haviam chegado a um acordo com os poderes da época e se esquecido que o ambiente pagão no qual viviam sempre seria, no mínimo, potencialmente hostil e nunca seria de confiança.

Eles haviam se esquecido de que “as autoridades superiores” eram dominadoras volúveis que facilmente poderiam se voltar contra eles.

  1. Desespero.

Se a assimilação era uma tentação que as pessoas enfrentavam nos dias de Ester, então o desespero sem dúvida era outra.

Elas estavam cercadas por um império todo-poderoso e volúvel que poderia muito bem se tornar antagônico.

Além do mais, eles seguiam um Deus cujo modo de agir era inescrutável, invisível e misterioso. O que, então, os impediria de entrar em desespero?

Como os Borg perceberam, o desespero e a assimilação estão estreitamente relacionados.

A razão para eles repetirem constantemente o lema “A resistência é inútil” é que aqueles que com MEDO; “perdem a esperança” são facilmente ASSIMILADOS.

Então, como poderiam os judeus exilados manter a esperança e a fidelidade em meio a um ambiente pagão hostil?

Como podemos ficar firmes diante das provações e dos desapontamentos da vida?

Assim como o judeu Tevye descobriu no desenrolar do filme “Um violinista no telhado”, seria preciso mais do que a resposta “tradição” para manter uma comunidade diferenciada. Que mais tarde ele e sua família será condenado ao exilio e a dispersão.

  1. Sátira.

Para a dupla tentação da assimilação e do desespero, o livro de Ester fornece uma resposta dupla.

Em primeiro lugar, ele satiriza o império, zombando de sua alegação de poder e autoridade.

A sátira toma o objeto de medo, a autoridade, e ri dele, mostrando seu lado ridículo. O objetivo do livro é nos fazer rir. Para as pessoas fracas e oprimidas a sátira é uma arma-chave.

Ela toma o tão alardeado esplendor imperial e o coloca no seu devido lugar. As ditaduras e os Estados totalitários nunca tiveram muito senso de humor no que diz respeito ao seu senso de autoimportância.

Livros como A REVOLUÇÃO DOS BICHOS[1], no qual George Orwell retratou e parodiou o COMUNISMO soviético de Stalin, foram rapidamente proibidos pelo império por causa do medo do poder da sátira.

No livro os porcos expulsam os humanos da fazenda e criam um governo igualitário, um dos porcos.

Um dos porcos que lidera a rebelião; “Napoleão”, toma o poder e se torna um ditador corrupto, corrompendo todos os “ideais utópicos” da sociedade dos bichos, e se tornando pior que os humanos.

Uma vez que as pessoas percebam que o rei de fato está nu, então o poder do império de exigir obediência e instilar o medo está quebrado.

Aquele que for capaz de rir na cara dos Borg jamais será assimilado. A sátira é, portanto, O poderoso antídoto para o desespero. A ironia divina, ri das pretensões humanas.

O livro de Ester nos mostra que o grande império não é, afinal de contas, governado por gigantes temíveis, mas por burocratas insignificantes

A classe governante da Pérsia é retratada não mais como “Os sete magníficos”, mas como “Assuero e os sete anões”.

  1. os bastidores.

A abordagem ao livro de Ester é nos mostrar que Deus está constantemente operando neste mundo de uma maneira totalmente diferente, digamos, dos acontecimentos do êxodo.

No livro de Êxodo, a ação de Deus é com raios e trovões, cheia de intervenções dramáticas que expõem a nulidade dos deuses do Egito.

Há grandes heróis como Moisés e Arão para conduzir o povo e um rastro de milagres para atestar a presença de Deus entre eles.

No livro de Ester, porém, vemos Deus operando de maneira invisível e nos bastidores. Nesse caso, não há milagres dramáticos nem grandes heróis. Há apenas providência aparentemente comum.

Pessoas fracas e inexpressivas são colocadas na hora certa e no lugar certo para enquadrar o império e estabelecer os propósitos de Deus para seu povo.

O nome de Deus não é citado em nenhum ponto do livro. Enquanto o nome de Assuero parece 175 vezes.

Contudo, no que diz respeito ao conflito entre o império de Assuero e os seus anões de um lado e o reino do Deus invisível e Todo-Poderoso do outro, só há um resultado possível.

III. A OSTENTAÇÃO E A VAIDADE

O livro de Ester inicia intencionalmente nos apresentando o grande império de Assuero. (Et 1.1-9).

Esse Assuero não era um desconhecido tirano de meia-tigela: ele reinava sobre 127 províncias desde a Índia até à Etiópia, de mar a mar.

John Mchartur e muitos outros eruditos, comentaristas e historiadores diz que ele é conhecido na história como Xerxes, o filho de Dario, e neto de Ciro o grande e pai de Artaxerxes de quem Neemias foi copeiro.

No filme 300, Xerxes é interpretado brilhantemente pelo ator brasileiro Rodrigo Santoro.

Assuero era jovem, bonito, inteligente, o homem mais poderoso do seu tempo e se considerava um deus-rei e se intitulava rei de reis.

Ele é retratado como um homem bastante alto, careca, de barba feita, usando várias correntes e percingis e o corpo pintado de dourado, sendo resultado de sua “transformação” em Deus-rei, exatamente como o filme mostra.

Seu pai Dario, havia sofrido uma derrota dos gregos na batalha de Maratona (490 a.c); aquela famosa batalha em que um homem correu 42 quilômetros. E é aí que obtemos a distância das maratonas dos dias modernos.

A sede de vingança cai sobre seu filho Assuero, que assume o trono em 486, e passa cinco anos se preparando para derrotar os gregos.

Heródoto diz que os persas tinham um exército de milhões de soldados de todas as nações e uma frota jamais vista de 1.207 navios de guerras.

Outros dizem que o exercito persa tinha 300.000,00 enquanto o grego apenas 7.000 soldados que incluíram 300 espartanos, e com 300 navios. Os dois filmes 300 em 2006 e 2014; retrata bem esses acontecimentos.

Ele mandou construir uma ponte de 1600 metros para seu exército marchasse sobre os gregos. Uma tempestade derrubou a ponte e ele mandou cortar as cabeças dos engenheiros, e mandou que dessem 300 chicotadas nas ondas do mar, por tamanho insulto.

Um imperador, vaidoso, cruel, excêntrico, comandando a maior frota militar do planeta, preste despejar toda sua fúria contra um punhado de gregos desunidos. Isso era algo digno de uma comemoração sem precedentes.

Ele dá uma festa digna de um semideus. Um evento de seis meses, para seus líderes militares, seus príncipes e nobres todos os poderosos do reino para comemorarem antecipadamente a vitória sobre os gregos.

Qualquer pessoa que fosse importante estava lá. Havia pilares de mármore e cortinas de linho branco e violeta, sofás de ouro e prata até mesmo pavimentos de mosaico feitos de materiais caros.

Até mesmo o chão no qual os convidados caminhavam e os assentos nos quais eles se sentavam eram feitos de coisas que outros anfitriões teriam mantido trancadas em segurança como tesouros preciosos.

Não havia duas taças de vinho idênticas e o vinho fluía livremente, graças à generosidade do rei.

Essa longa descrição serve a um importante propósito na narrativa. O objetivo é fazer com que fiquemos impressionados e maravilhados com essa demonstração de tanta gloria, excessos e prazeres.

De mesmo modo que ficamos tanto impressionados quanto revoltados quando lemos relatos sobre os casamentos das estrelas de Hollywood — as flores, as bandas, os corais, os fogos, o vestido ultrajantemente caro — nesse caso também deveríamos ficar tanto impressionados como revoltados.

Assuero é a própria imagem do poder e da riqueza, que são esbanjados nos seus próprios apetites, luxurias e orgias.

No entanto, um detalhe-chave inicia o processo de DESCONSTRUÇÃO DO IMPÉRIO diante dos nossos olhos, preparando-nos para a revelação de que o rei que tinha um armário cheio de roupas tão bonitas estava nu.

Esse detalhe está no versículo 8: “Bebiam sem constrangimento, como estava prescrito, pois o rei havia ordenado a todos os oficiais da sua casa que fizessem segundo a vontade de cada um”.

Isso continua a falar sobre o poder de Assuero até mesmo a bebida servida na sua festa tinha de estar em conformidade com a lei dele.

Nada escapava ao CONTROLE IMPERIAL: foi exigido um edito para assegurar que ninguém estava sob coação.

Todavia, um poder que regulamenta a tal ponto necessariamente implica excesso de burocracia.

O poder real não consiste em regular tais minúcias. Na verdade, a tendência de regular esses detalhes é de fato um sinal de fraqueza e não de poder.

Os excessos de burocracia, existe para compensar a falta de importância real por meio da atenção excessiva a minúcias.

Sempre que damos atenção demasiadas a detalhes, podemos estar escondendo a falta de cuidado com o que realmente deveria valer a pena.

Assim era o império de Assuero. Quando lemos sua descrição, de tanta vaidade e arrogância é difícil não rir. Pois tudo isso é só uma ILUSÃO HIPÓCRITA, pois toda essa OSTENTAÇÃO vai sumir como bolha de sabão em instantes.

  1. DESAFIANDO O IMPÉRIO.

O processo de desconstrução do império continua na cena seguinte. Depois o rei o grande rei Assuero, dá uma festa para toda a cidade, pobres e ricos, e continua bebendo por sete dias seguidos.

Com um toque característico de exagero, ele enviou nada menos do que sete dos seus eunucos reais para intimar sua rainha, Vasti.

Ela deveria comparecer usando sua coroa real para que os nobres e demais pessoas pudessem admirar sua beleza (Et 1.10-11).

Os rabinos podem ter extrapolado o texto quando interpretaram que a ordem a Vasti era aparecer usando nada mais do que a sua coroa real.

A ordem para que sua esposa aparecesse vestida com suas finas roupas reais para o deleite de uma multidão de homens bêbados era ofensiva.

Ela seria tratada como uma BONECA, um mero objeto que existia para o prazer e exibição do poder do rei.

Uma “ESPOSA TROFÉU”, para usar o jargão de hoje. O decreto “sem constrangimento” (1.8) não se aplicava a ela. Vemos aqui o lado negro de colocar tanto poder nas mãos de um homem que só pensa em si mesmo.

Mas nesse caso o poder bruto do império encontrou um empecilho: “Porém a rainha Vasti recusou vir por intermédio dos eunucos, segundo a palavra do rei; pelo que o rei muito se enfureceu e se inflamou de ira (Et 1.12).

A lei dos persas e dos medos, que não podia ser revogada, podia, porém, ser recusada. A rainha Vasti, que, de acordo com o costume persa vinha dando uma festa separada para as mulheres (Et 1.9), recusou atender as exigências sem sentido de Assuero.

A lei podia ser capaz de obrigar as pessoas a beber quanto quisessem, mas não podia afinal obrigar a esposa do rei a ser tratada como um objeto sexual.

Uma simples mulher se ergueu e disse “não” e sacudiu as bases do império com sua recusa. Alguns acreditam que ela estivesse gravida de Artaxerxes, e por isso não recebeu a pena de morte.

O que deveria ser feitos? Uma conferência real com os sábios do império foi convocada para elaborar uma solução para a perigosa ameaça contra a autoridade (Et. 1.13-15).

Os conselheiros do rei Assuero, por sua vez, estavam apavorados com a possibilidade da política “APENAS DIGA NÃO” da rainha se espalhar por todas as casas no império (Et 1.16-18).

Que horror! O que aconteceria com a posição do homem na sua própria casa quando se tornasse conhecida a desobediência da rainha Vasti à ordem do rei?

  1. O IMPÉRIO CONTRA-ATACA.

No entanto, de que serviu a resistência de Vasti? Pessoalmente, ela perdeu sua posição de poder e prestígio como rainha, e o rei ouvi o conselheiro imperial (Et 1.19-20).

Assim, Vasti foi despojada do seu título. Ao que parece, a lei triunfou, pois a regulação a que ela resistiu também lhe trouxe punição (Et 1.15).

Fica claro, no entanto, que “a lei” servia apenas como encenação para cobrir o capricho do rei e dos seus conselheiros.

Uma vez que Vasti escolheu não aparecer diante do rei quando intimada, ela nunca mais iria aparecer diante dele.

Em vez disso, o lugar dela seria dado a alguém “melhor do que ela”. O sofrimento dela não libertou ninguém, nem mesmo ela, e foi, no final das contas, um gesto tolo.

Pragmaticamente, Vasti é um modelo de como não fazer as coisas dentro do império: o prego que ousou sobressair foi de fato martelado por causa disso.

Ester teria de ser muito mais cuidadosa e sutil ao lidar com o império se ela quisesse acalmar a situação.

Contudo, a recusa de Vasti serve para revelar a fraqueza da lei para ordenar o comportamento. A resistência é possível. A ASSIMILAÇÃO à vontade do império não é inevitável.

Parece que a lição não foi aprendida pelo império, que logo se apressou a fazer outra lei que não tinha poder para impor:

O conselho pareceu bem tanto ao rei como aos príncipes; e fez o rei segundo a palavra de Memucã. Então, enviou cartas a todas as províncias do rei, a cada província segundo o seu modo de escrever e a cada povo segundo a sua língua: que cada homem fosse senhor em sua casa, e que se falasse a língua do seu povo (Et 1.21-22).

Pense na futilidade dessa regulação: “que cada homem fosse senhor em sua casa” (Et 1.22). Todo o peso da autoridade imperial estava por trás desse edito: era um decreto real, uma lei que nunca poderia ser revogada (veja Et 1.19).

Todos os recursos do império foram mobilizados para disseminar esse edito por meio dos correios reais — que era algo formidável no império persa.

Um complexo sistema de cavalos e carruagens de despacho dispostos em pontos e distancias estratégicas espalhadas por todo império, que carregavam rapidamente os desejos do imperador para as mais distantes províncias.

Mas qual foi o resultado de todo esse esforço? De fato, a ordem social persa estava ameaçada pela resistência dessa única mulher?

Ainda que estivesse, pode tal princípio de autoridade do homem ser imposto por decreto governamental?

Todos os homens devem exercer o poder de maneira tão egoísta, como Assuero, e depois esperar obediência imediata?

Todo homem deve banir a esposa se ela não se submeter à sua vontade?

Na verdade, o edito se AUTODESCONSTRÓI. Ele serve apenas para publicar por todo o vasto império e na língua de todos os grupos de pessoas a FALTA DE AUTORIDADE de Assuero.

Se o objetivo era inspirar respeito pelos maridos e Assuero, o verdadeiro efeito foi exatamente o contrario.

Se ele temia que a fofoca sobre sua impotência se espalhasse, o seu edito agora garantiria que todos ouviriam a história.

Mais uma vez, ao mesmo tempo em que ficamos impressionados com o poder de Assuero, fica difícil não rir de como ele bate sua marreta numa noz e erra.

O fato de o rei estar nu serve de pouco consolo para seus súditos. Como nos mostra o livro de Ester, podemos ver que o capricho de homem mimado pode fazer.

Platão usava Xerxes, como alguém que O MIMO O EXCESSO, tonava as pessoas sem condições de serem virtuosas.

O decreto dele em relação a Vasti revela uma fraqueza de caráter. Ao mesmo tempo, ele é cercado e manipulado por conselheiros que também lidam com o poder com mais entusiasmo do que habilidade.

É como se, estivéssemos na mesa de cirurgia, e víssemos os cirurgiões primeiro praticando com serras em toras de madeira, e errando sem parar, antes de nos operar.

Esse é o mundo no qual o povo de Deus se encontrava e, frequentemente, ainda se encontra: um mundo em que as rédeas do poder estão nas mãos de incompetentes, e no qual somos conduzidos, na melhor das hipóteses, por pessoas amorais e, na pior, por imorais. É assim para muitos no trabalho ou até mesmo em casa.

Muitos cristãos em todo o mundo vivem ou em países que na prática são ditaduras, ou em que o verdadeiro poder parece estar nas mãos de uma máfia local ou de um cartel de drogas, não na de agentes governamentais eleitos.

Este mundo é um lugar perigoso, onde o poder e a sabedoria em geral não andam lado a lado.

Viver com tais pessoas tendo o poder de vida e morte pode bem não parecer um motivo de riso, mas, às vezes, o bom humor é a melhor maneira de começar a reagir.

  1. A VIDA SOB O IMPÉRIO

O que aprendemos para nossa própria caminhada no mundo a partir do primeiro capítulo de Ester?

  1. Não leve a sério.

O capítulo 1 de Ester nos lembra a não levar a sério demais o poder e a glória deste mundo. Às vezes temos de apenas rir. O mundo se leva muito a sério, e quer que o levemos a sério também.

Vivemos numa sociedade que constantemente exalta o trivial. Revistas inteiras são dedicadas às excentricidades das estrelas de novelas.

Nossa cultura paga quantias inacreditáveis de dinheiro para adultos cujo único talento é chutar ou jogar uma bola. E ainda achamos que Assuero era um esbanjador?

Em nosso mundo consideramos o carro que dirigimos uma extensão do que somos; ficamos mais impressionados pela escola que alguém frequenta do que pelo que ele aprende lá. E ainda achamos que os burocratas de Assuero eram focados em trivialidades?

O império de materialismo em que vivemos leva as coisas desesperadamente a sério. Ele quer que estudemos as leis do império e aprendamos a como nos conduzir segundo os padrões do império do mundo.

Ele quer que sonhemos com banquetes que duram seis meses em jardins maravilhosamente decorados, e então dedicar nossa vida a tentar realizar esse sonho.

E fácil ficarmos maravilhados com a demonstração de ostentação do império, do mundo, mas no fundo, ele é vazio de poder e de verdade. O império deste mundo é um HOLOGRAMA brilhante que não tem conteúdo algum.

Para nos defender do risco de sermos ASSIMILADOS, precisamos aprender a rir do império.

Temos de aprender a rir das pessoas ao nosso redor que desperdiçam a vida em busca de tantos objetivos inúteis.

Temos de rir de nós mesmos quando vemos nosso próprio coração usando a escala de valores do império. De que vale ao homem poder dar festas de seis meses com sofás de ouro sobre um piso de madeira de peroba?

Como somos ridículos, então, quando gastamos ainda mais tempo e energia desejando um novo carro esportivo, um par de tênis no shopping ou o mais recente utensílio doméstico num catálogo de encomendas?

No final das contas, tudo isso é vazio. As roupas caras do rei são transparentes e o que se pode ver através delas, por olhos com discernimento, é ridículo.

O que é realmente precioso se encontra nos valores de um IMPÉRIO completamente diferente.

  1. Confie na providencia.

O primeiro capítulo de Ester nos mostra que às vezes temos de esperar para ver o que Deus está fazendo. Parece que Deus não pode ser visto em nenhum ponto nesse capitulo.

Isso não é de admirar, já que em todo o livro de Ester ele parece não ser visto em parte alguma. Contudo, o fato de não podermos ver Deus trabalhando não quer dizer que ele não esteja atuando.

Em todo o livro de Ester ele está extremamente ocupado como o diretor invisível da História, organizando todas as coisas para o bem do seu povo.

A ironia divina, ri das presunções e ostentações do maior imperador da época e é vencido por uma mulher.

A ironia divina, conduz a maior frota militar já comanda desse planeta, ser vencida por leões, tempestades, e uns poucos fracos gregos, conforme disse o Historiador Heródoto.

Nem mesmo Ester e Mordecai ainda não apareceram em cena, mas os acontecimentos da História estão silenciosamente sendo controlado pelas mãos de um Deus soberano.

Por que Vasti a esposa do imperador, jogou fora sua posição e seu privilégio num gesto nobre, mas previsivelmente inútil? E, para começar, por que Assuero fez sua exigência insensata?

Quem teve a ideia de substituir Vasti por uma mulher melhor, em vez de resolver discretamente a ofensa que Assuero havia causado?

Porque não mandar executar trazer a força ou executá-la, já que ele é o imperador?

Todos esses acontecimentos são completamente explicáveis como acontecimentos humanos normais, sem nenhum componente miraculoso.

Ainda assim, todos são necessários para abrir caminho para o processo pelo qual Ester será elevada à posição de rainha, na qual ela poderá usar seu poder e influência para proteger o povo de Deus contra seu poderoso inimigo.

Porque um exercito de milhões, e milhares de navios, são vencidos por 7.000 mil soldados e poucos navios?

O que visualizamos por meio de um filme, que mostra a mão de Deus dirigindo todas as coisas.

O que uma batalha épica, como Maratona e Salamina tem haver com o povo de Deus e com Jesus Cristo seu filho, na preservação dos judeus?

Coincidências? De modo algum. Antes, esses acontecimentos são a mão de Deus operando de uma “maneira diferente” do que é visto em outros lugares da Bíblia.

Observe, no entanto, que nenhum desses acontecimentos teria parecido algo significativo para a comunidade judaica em Susã na época. Como parece muitas vezes para nós.

Uma guerra entre gregos e persas? Um imperador frustrado e derrotado, que volta da guerra, desejando ser consolado por uma esposa?

Uma simples menina, se torna a rainha do maior império da época. O que essa mudança de rainha provoca?

Quem se importa com o que aqueles pagãos estão fazendo? Como os gregos e persas? O que isso tem a ver com o preço do pão na padaria?

Somente olhando para trás é possível ver todos os detalhes complexos do plano de Deus trabalhando para o bem do seu povo.

Assim também na nossa vida e podemos não ter ideia do que Deus está fazendo. Ele pode parecer oculto e distante, recusando-se a atender as nossas orações e nos dar o que tão sinceramente pedimos a ele. Espere.

Ainda não chegamos ao fim da história. Quem sabe como as partes do quebra-cabeça que hoje parecem não ter conexão lógica entre si no final se encaixarão?

Mesmo que não possamos ver Deus agindo, isso não quer dizer que ele não esteja fazendo nada.

A ação de Deus não é ruidosa; às vezes é um agir silencioso, fiel às promessas que ele fez, atuando nas providências aparentemente comuns da vida, produzindo nos corações do seu povo o que ele se propusera.

  1. O rei nos ama.

Essa passagem mostra que o reino de Deus não é como o império de Assuero. O livro de Ester constantemente nos conclama a comparar e contrastar o reino de Deus com o império de Assuero.

Há SEMELHANÇAS SUPERFICIAIS entre os dois reinos, mas em cada caso elas escondem DIFERENÇAS PROFUNDAS.

O Senhor também é um grande rei cujos decretos não podem ser desafiados ou revogados.

Ele governa soberanamente todas as coisas, grandes e pequenas. Ele deve ser obedecido ou certamente sofreremos as consequências.

No entanto, sua lei é benéfica para homens e mulheres, diferente das oscilações bêbadas de um homem à mercê dos seus conselheiros insensatos.

Deus não usa as pessoas para atingir seus propósitos como se elas fossem mercadorias descartáveis.

Em vez disso, ele graciosamente as convida a um relacionamento de amor com ele. O reino dele não cresce e opera por meio de atração e poder exteriores, mas de maneiras ocultas, porém eficazes.

Por essa razão, Jesus compara o reino de Deus ao crescimento de uma semente de mostarda ou a ação do fermento.

Ele começa pequeno e oculto, porém, atinge seus objetivos (Mt 13.31-33). No serviço a Deus o que é grande não é necessariamente bonito.

O tema do banquete messiânico nos fornece outro ponto de comparação e o contraste entre o reino de Deus e o império de Assuero.

O Senhor também preparou um banquete suntuoso para o seu povo no último dia.

Mas quando Deus intima sua noiva (a igreja) para seu banquete, ele o faz não para expô-la à vergonha, mas para conceder sua graça e misericórdia a ela.

Ele não força os pecadores a ir a sua festa contra a vontade, mas gentilmente os persuade e os atrai para si mesmo.

Podemos entender por que Vasti estava relutante em aparecer diante de Assuero, mas quem se recusaria a tão maravilhoso convite de Deus para viver a vida em sua totalidade?

Não há nada de nobre em se recusar a aparecer diante de um Deus tão bom e gracioso. Pelo contrario, não comparecer é o cúmulo da insensatez e ingratidão.

Você já recebeu o convite dele para ir e aceitou? Se não, então você também, como Vasti, está condenado a ser banido da presença dele para sempre.

Por que você escolheria morrer? Por que não deixar de lado toda a sua resistência e ir à festa?

Isso fica ainda mais evidente quando consideramos o que Cristo fez pela sua noiva.

Longe de considerá-la como um lindo objeto que existe somente para alimentar o seu orgulho e prazer, ele toma alguém que era por natureza completamente sem atrativos e da a si mesmo por ela, ao entregar a própria vida pelo seu povo.

Quando ainda estávamos mortos em nossos pecados e transgressões, Cristo se entregou por nós, deu sua vida como um resgate pelos ímpios.

Tudo o que temos, até mesmo a justiça com a qual estamos vestidos para aparecer diante de Deus, vem de sua boa mão.

Como pode o nosso coração não ser mais uma vez tocado com suave amor pelo rei que nos amou de maneira tão gratuita e graciosa?

Com um marido assim nos chamando, por que não responderíamos alegre e prazerosamente ao seu convite?

Um Rei que fez tanto por nós com certeza pode nos pedir qualquer nível de obediência.

De fato, é assim que o Senhor estabelece o homem como cabeça do lar. Como o rei Assuero, Deus também decreta que os homens de criam liderar suas casas, mas as diferenças são muito mais perceptíveis do que as semelhanças.

O decreto de Deus não é um gesto vazio e fútil. Para os homens que seguem a Jesus, ser o cabeça nunca pode ser um mero exercício bruto de poder — como o foi para Assuero.

O assim chamado “cabeça” que simplesmente usa esse termo como uma desculpa para o controle tirânico é um arremedo do modelo bíblico.

Pelo contrário, a liderança cristã em casa e na igreja é estabelecida e arraigada no amor AUTOSACRIFICIAL de Cristo por sua noiva.

Num lado da moeda temos: “As mulheres sejam submissas ao seu próprio marido […] Como, porém, a igreja esta sujeita a Cristo” e no outro: “Maridos, amai vossa mulher, como também Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela” (Ef 5.22-25).

O verdadeiro amor não consiste no marido usar sua esposa como um objeto para satisfazer os próprios desejos e as próprias necessidades.

Mas sim no marido que dá a si mesmo pela sua esposa, conduzindo-a gentilmente para que desenvolva os próprios dons e aspirações piedosas.

O evangelho do amor de Cristo por nós é o fundamento para mentes renovadas que se agradam em se submeter à ordenação divina da criação.

Se os maridos cristãos fossem mais como Cristo e menos como Assuero, talvez então nossas esposas estivessem mais dispostas a se submeter à nossa liderança.

CONCLUSÃO

 Quem, então, é o verdadeiro rei e com quem o seu coração esta comprometido? O império quer nos escravizar. Ele quer nos incorporar à sua maneira de pensar.

Ele nos oferece prêmios reluzentes para que nos submetamos a seus métodos — uma vida “de sucesso”, de acordo com as suas próprias definições. Você foi seduzido e apanhado?

Fuja dessas coisas para o reino que é sólido e substancial, o reino que Jesus Cristo veio estabelecer. Aprenda a rir de como são vazias as prioridades e os editos do império.

Vá para Cristo pela fé e descanse na provisão, no perdão e na vida que ele dá. Agradeça a ele pelo dom de si mesmo na cruz por nós. Viva de acordo com seus editos, nos quais a verdadeira sabedoria reside.

Confie que ele está agindo como prometeu, operando até mesmo por meio dos perversos impulsos do império para o bem da nossa vida e da de todas as pessoas.

Por fim, lembre-se que este mundo não é nosso lar: um dia, quando Jesus retornar, nossa necessidade de nos equilibrar no telhado irá acabar e o verdadeiro banquete irá começar.

[1] https://pt.wikipedia.org/wiki/Animal_Farm

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