Série de sermões expositivos sobre o livro de Eclesiastes. Sermão Nº 02 – Sempre a mesma coisa. Eclesiastes 1:3-12. Pregação do Pastor Jairo Carvalho em 01/04/2020.
INTRODUÇÃO
A fim de comemorar o 300º (tricentésimo) aniversário do cidadão mais famoso da Filadélfia, a Orquestra oficial da Philadelphia contratou um famoso maestro para compor uma nova obra de música em homenagem a Benjamin Franklin.
Quando sua contratação foi anunciada em uma pré-estreia da temporada da orquestra de 2006, o compositor pediu algumas sugestões ao público.
Que palavra as pessoas usariam para descrever uma obra de música que fizesse jus ao senhor Franklin?
“REVOLUCIONÁRIO”, respondeu alguém, pensando no papel central de Franklin na libertação dos Estados Unidos da tirania inglesa.
“ELÉTRICO”, gritou outro membro do público, pensando no famoso experimento com a pipa, a chave e o raio.
Mas o homem que mais provocou risadas e gargalhadas sugeriu que o Maestro garantisse que sua composição fosse “LUCRATIVA”.
Afinal de contas, o que corresponderia mais ao espírito empreendedor de Benjamin Franklin do que ganhar um pouco de dinheiro?
Muitas das famosas máximas de Franklin promovem o bom e honesto capitalismo.
Ele fez comentários sobre o valor do dinheiro (“Nada além de dinheiro é mais doce do que mel”).
Ele elogiou a virtude do trabalho duro(“Deitar-se cedo e levantar-se cedo deixam um homem saudável, ricoe sábio”).
Ele incentivou as pessoas a serem econômicas (“Fique atento a pequenas despesas; um pequeno furo afunda um grande navio”).
E seu provérbio mais famoso: “Um centavo guardado é um centavo ganho”.
Como empreendedor bem-sucedido, ele pôs todos esses princípios em prática. Se alguém sabia como ganhar dinheiro, esse homem era Benjamin Franklin.
Então vejamos o que o pregador de Eclesiastes; homem mais rico e sábio fala sobre isso.
- A motivação do lucro
O homem que escreveu Eclesiastes teve a mesma motivação. Seu nome hebraico era Kohelet; em português, nós o conhecemos como o Pregador.
Da declaração feita no primeiro versículo e de outros detalhes no livro, sabemos que ele era ou o próprio Salomão ou alguém que queria apresentar a trágica queda desse rei famoso como um CONTO DE ALERTA.
Mas independentemente de como o identifiquemos, esse homem queria que a vida lhe pagasse alguns dividendos.
Como Benjamin Franklin, ele tinha muitas coisas sábias a dizer sobre a vida cotidiana, e estava sempre atento a alguma coisa que pudesse usar a seu favor.
Vemos isso na pergunta inicial do Pregador. No versículo 2, ele declara o tema de seu livro e o lema de sua vida: “Vaidade de vaidades! Tudo é vaidade”.
Então, no versículo 3, ele começa a defender sua TESE segundo a qual nossa existência é vazia, perguntando: “Que proveito tem o homem de todo o seu trabalho, com que se afadiga debaixo do sol?” (Ec 1.3).
A mesma pergunta ressurgirá no capítulo 3: “Que proveito tem o trabalhador naquilo com que se afadiga?” (v. 9).
A ideia de obter algum lucro também ressurgirá várias vezes; esse tema ocorre quase uma dúzia de vezes no livro de Eclesiastes (p. ex., Ec 5.9).
A palavra “PROVEITO” (yitron, em hebraico) é um termo comercial normalmente usado no contexto de negócios. Refere-se a um excedente, a algo que sobra após o pagamento de todas as despesas.
Essa é a meta que todos que trabalham no comércio tentam alcançar. A meta é obter um LUCRO como recompensa pelo trabalho. O ganho é o retorno sobre o investimento do trabalho duro.
Como alguém que sempre estava de olho no lucro, o Pregador queria obter um bom retorno. Ele estava disposto a trabalhar muito, mas primeiro queria saber o que estava em jogo.
Assim, faz a pergunta que todas as pessoas fazem em relação a qualquer emprego: Vale a pena? Estou realmente realizando algo importante? O que receberei por todo o meu trabalho?
As pessoas costumam acreditar que, se trabalharem um pouco mais, receberão um pouco mais do que elas teriam de outra forma. Mas o Pregador começara a duvidar se isso realmente se aplicava à vida.
Por isso, ele pede que reflitamos sobre o que teremos a apresentar para nós mesmos quando nossa vida na terra terminar. A resposta que o Pregador dá aqui é: absolutamente nada.
Ele levanta a pergunta para nos envolver na discussão, mas sua pergunta é puramente RETÓRICA. O pregador já conhece a resposta. Ele pergunta apenas para chamar nossa atenção.
Segundo a sua experiência, não importava quanto as pessoas trabalhavam, elas nunca ganhavam qualquer coisa realmente significativa.
A palavra que ele usa para “labuta” é simplesmente a palavra hebraica comum para “trabalho” (‘amal), mas, às vezes, ela possui uma conotação negativa, como parece ser o caso aqui.
As pessoas trabalham muito, labutam por algum tipo de lucro, mas o que elas recebem em troca de todo seu esforço?
Muito pouco — ou nada. O problema do esforço infrutífero — e a dificuldade de algumas pessoas de percebê-lo — é ilustrado com um curto poema de Stephen Crane:
Vi um homem buscando O horizonte; correndo dando voltas. Perturbei-me com isso; Abordei o homem. “É eu disse, “Você jamais conseguirá” “Mentira”, ele gritou E continuou a correr’
- Andando em círculos
Para demonstrar seu argumento — que nossos esforços dão em nada — o Pregador apresenta uma lista de coisas que parecem levar a nada ou não trazer nenhum lucro.
A primeira parte de seu poema introdutório dá exemplos da criação — do mundo natural (v. 4-7).
A segunda parte dá exemplo da experiência humana (v. 8-11).
Mas não importa se contemplamos o mundo à nossa volta ou consideramos as experiências da nossa própria vida, o resultado é o mesmo: não há nada a ganhar.
As pessoas gostam de falar sobre o PROGRESSO — desenvolvimento econômico, avanços tecnológicos, melhoras evolucionárias — mas tudo isso não passa de um MITO.
Nunca haverá qualquer avanço: nada muda, tudo permanece igual. A começar pela natureza -terra, vento, fogo e água.
O pregador diz: “Geração vai e geração vem; mas a terra permanece para sempre” (Ec 1.4).
Quando pessoas pensam na geração seguinte, elas costumam pensar em termos do PROGRESSO.
Nossos filhos são nosso futuro; eles realizarão coisas que vão muito além de qualquer coisa que nós jamais pudemos sonhar.
Seja a geração X ou a geração Z, sempre há alguma geração que nos da esperança para o futuro. Mas, como sempre, Eclesiastes assume uma visão mais sombria.
Geração vai e geração vem, diz o autor. (Uma geração pode estar emergindo), mas, ao mesmo tempo, outra geração está morrendo.
Em breve, a geração mais nova se tornará a geração mais velha, e haverá outra geração depois desta.
É sempre a mesma coisa. O conflito de gerações também nunca parece mudar. Aos olhos dageração emergente, toda pessoa acima dos 30 parece ANTIQUADAe DESCONECTADA.
Por outro lado, as pessoas mais velhas ficam chocadas diante da aparente falta de respeito com que são tratadas pela geração mais nova.
Mas isso sempre tem sido assim.
Sócrates já falou sobre isso na Antiguidade: “As crianças de hoje amam o luxo. São malcriadas, desdenham a autoridade e desrespeitam os anciãos”.
Semelhantemente, Pedro, o Eremita (1050-115), um monge francês disse:
“As pessoas jovens de hoje pensam em nada além de si mesmas. Elas não têm respeito pelos pais ou pelos mais velhos. São impacientes diante de qualquer restrição. Falam como se fossem as únicas que sabem de tudo”.
Enquanto isso, o mundo em si permanece o mesmo. Nunca ocorre qualquer progresso.
A emergência de cada geração passa a impressão de que algo esteja acontecendo, mas, na verdade, nada acontece.
Uma procissão aparentemente infinita de pessoas vem e vai, “mas a terra permanece para sempre” (Ec 1.4). O mundo é um lugar muito repetitivo. Nada muda. Então que proveito há nisso? O que ganhamos?
Jerônimo disse: “O que é mais vão do que esta vaidade: que a terra, que foi feita para os homens, permanece – mas os homens em si, os senhores da terra, de repente se dissolvem em pó?”.
É mais uma ilustração do mesmo princípio: “Levanta-se o sol, epõe-se o sol, e volta ao seu lugar, onde nasce de novo” (Ec 1.5).
Há um famoso romance escrito por norte-americano Ernest Hemingway (1926): O sol também se levanta (1926). Ele trata exatamente da ausência de sentido da ida debaixo do sol.
Até a jornada diária do SOL parece sem sentido. O sol dá suas voltas, mas nunca chega a lugar algum. Dia após dia, a bola de fogo no céu se levanta, se põe e se levanta novamente. Seu movimento é repetitivo, mas não progressivo, igual à vida.
Então, você corre e corre para alcançar o sol, mas ele está se pondo. Dando a volta para se levantar novamente por trás de você. O sol é o mesmo num sentido relativo, mas você está mais velho, com menos fôlego e um dia mais próximo da morte.
Segundo Eclesiastes, até mesmo o sol perde o fôlego. A palavra “volta” é, na verdade, a palavra hebraica para “ofegar” (sha ‘ap), que pode indicar que o sol corre do Leste para o oeste e de volta para o leste.
Mas é uma linguagem que também pode significar que o sol se cansa de sua jornada lenta e infinita pelo céu.
Normalmente, voltamo-nos para a natureza para encontrar encorajamento para a alma, mas quando o Pregador olha para o sol, tudo o que ele vê é simplesmente a MONOTONIA da vida em um universo ESTÁTICO.
O VENTO nos mostra a mesma coisa, pois ele também não obtém um resultado melhor do que o sol: “O vento vai para o sul e faz o seu giro para o norte; volve-se, e revolve-se, na sua carreira, e retoma aos seus circuitos” (Ec 1.6).
Normalmente, imaginamos o vento soprando do Oeste para o leste, como a corrente de jato, mas na Palestina o vento vem às vezes da direção norte ou sul.
É provável que este seja o fenômeno mencionado aqui, para completar os pontos cardeais: o SOL rasteja do Leste para o Oeste, enquanto o VENTO sopra do Norte e do Sul.
Ele parece ter toda liberdade de soprar como bem entende, e Jesus usa essa verdade como base para uma de suas analogias mais famosas — nascer de novo pelo poder do Espírito Santo (veja Jo 3.8).
No entanto, o vento segue suas correntes costumeiras. Ele sopra, passa e volta. Ele dá suas voltas, seguindo seu CURSO CIRCULAR, MAS NUNCA ALCANÇA UM DESTINO.
Por mais constante que seja o seu movimento, ele nunca progride. O fluxo da ÁGUA parece igualmente inútil.
“Todos os rios correm para o mar“, diz o Pregador, “e o mar não se enche; ao lugar para onde correm os rios, para lá tornam eles a correr” (Ec 1.7).
Quando ele fala sobre como a água corre e torna a correr, ele não está descrevendo o ciclo da água, no qual a água evapora, forma nuvens e eventualmente retoma para molhar a terra a forma de chuva.
O pregador está falando sobre como todos Os rios e correntezas correm sempre para o mar. Em Israel, existe um exemplo vivido disso. O mar Morto é cercado por terra; ele não encontra como o oceano.
No entanto, durante todos os séculos em que o rio Jordão tem desembocado e alimentado o mar Morto, o mar não se encheu; e assim a água continua a correr.
A vida é igual. Tudo parece preso numa rotina. Onde está O progresso? Qual é o lucro disso?
Você passa sua vida inteira trabalhando para uma empresa após a outra, mas o que você ganha em troca de toda a sua labuta?
Mesmo o trabalho de casa. Sempre há as refeições a serem preparadas, sempre há mais pisos a serem varridos, mais roupas a serem lavadas.
O dia a dia é como a famosa música do musical Show Boat, em que o Old Man Rire,– simplesmente continua a correr.
A música é cantada por Joe, um trabalhador nas docas do rio Mississippi, exausto de tanto trabalhar. As palavras que canta se parecem muito com Eclesiastes:
“Ah! cansei-me
Cansei-me de tentar
Estou cansado de viver
E com medo de morrer:
Mas o velho Senhor Rio,
Ele simplesmente continua a correr!’
- O que há de novo?
Se o sol e o vento e os poderosos rios nada têm a mostrar em troca de seu trabalho constante, então que esperança temos nós de realizar qualquer coisa na vida?
O Pregador se cansa só de pensar nisso. Então, ele resume tudo que observou na natureza nestas palavras: “Todas as coisas são canseiras tais, que ninguém as pode exprimir” (Ec 1.8).
A vida é tão enfadonha, uma preocupação tão exaustiva, que é difícil até mesmo para colocar em palavras.
Há uma versão[1] em inglês que traduz assim esse verso:”A vida é muito mais entediante do que as palavras conseguem expressar”.
Com essa declaração, o Pregador reforça o tema central de seu poema. Ele está tentando mostrar quanto a vida é cansativa. No entanto, ele ainda não chegou ao fim de seu argumento.
Não é só o mundo natural que prova quão pouco há para se ganhar na vida, mas também a nossa experiência pessoal. Podemos começar pela PERCEPÇÃO SENSORIAL.
Temos aqui um exemplo notável da fadiga de todas as coisas: “os olhos não se fartam de ver, nem se enchem os ouvidos de ouvir” (Ec 1.8). As pessoas estão sempre olhando e ouvindo.
Isso vale especialmente para a nossa ERA DA INFORMAÇÃO. A cada dia, vemos uma procissão infinita de imagens visuais: Instagram, facebook, YouTube, Netflix. Podemos ouvir também um fluxo infinito de sons: iPod, iPhone, iTunes, TV, Instrumentos musicais, radio etc…
Contudo, mesmo após vermos e ouvirmos tudo, nossos olhos e ouvidos ainda não se contentam.
Queremos ouvir e ver ainda mais. E logo voltamos a ingerir mais daquela procissão infinita de sons e imagens. Jamais nos satisfazemos.
Sempre há algo mais a ver, mais um jogo a jogar, mais uma música a ouvir. Assim, continuamos mandando mensagens, postando vídeos e fotos no Facebook, escrevendo no Twitter, curtinho vídeos etc.
Mas o que ganhamos com isso? O que realizamos? Há algum lucro real nisso?
Estas são perguntas importantes que devemos fazer sobre tudo que vemos e ouvimos:
- Isso me ajuda a fazer algum tipo de progresso, ou é a mesma coisa de sempre?
- Ou estou fazendo isso porque todo mundo faz?
Como o mar que nunca se enche, “os olhos não se fartam de ver, nem se enchem os ouvidos de ouvir” (Ec 1.8).
Veja que o enfado infinito da história humana, que sempre parece se repetir: “O que foi é o que há de ser; e o que se fez, isso se tornará a fazer; nada há, pois, novo debaixo do sol” (Ec 1.9).
POR, MAS QUE AS COISAS MUDAM ELAS PERMANECEM AS MESMAS. Nações se levantam e caem, mas a natureza humana permanece a mesma.
Há tempos de guerra e há tempos de paz, mas mesmo em tempos de paz sabemos que a guerra retornará.
Na verdade, alguns conflitos parecem nunca acabar, como a luta eterna entre judeus e árabes pelo controle da Palestina, que já foi entre judeus e filisteus.
As pessoas vivem uma espécie de DÉJÀ VU, temos a ideia, de que tudo se repete o tempo todo.
Não há nada de novo debaixo do sol — apenas repetições. Isso é uma alegação tão generalizada que poderíamos estar tentados a citar um exemplo contrário.
Deve existir pelo menos uma coisa que é nova debaixo do sol. Por um momento, o Pregador parece quase disposto a contemplar essa possibilidade.
Ele pergunta: “Há alguma coisa de que se possa dizer: Vê, isto é novo?”.
Mas rapidamente ele descarta essa possibilidade. Tudo que parece ser novo “já foi nos séculos que foram antes de nós” (Ec 1.10).
Para dar apenas um exemplo, veja a descoberta do Novo Mundo. Como toda criança sabe, “em 1492, Colombo navegou o mar azul”.
Mas será que Cristóvão Colombo foi mesmo o primeiro europeu a pisar em solo norte-americano’?
E quanto aos Vikingse aos pescadores “bascos” e que ja atravessavam o Atlântico pescando bacalhau nas costas da Terra Nova?
Ou os comerciantes de Bristol, na Inglaterra, que escreveram a Colombo após seu retorno triunfante, reclamando que ele sabia muito bem que eles já haviam passado pela América antes dele.
E quanto às viagens no século 15 de Zheng He e da frota imperial da China? Ou, falando nisso, quanto a Leif Ericson e os outros exploradores nórdicos que alcançaram o Novo Mundo quatrocentos anos antes disso?
Talvez fosse possível pensar em alguma descoberta ou invenção que represente um avanço real em conhecimento ou tecnologia.
Mas até os desenvolvimentos mais recentes pertencem à mesma categoria de experiência humana, como transporte e comunicação.
A TELECOMUNICAÇÃO sem fio pode ser um legítimo avanço do século 20, mas há algo familiar nisso também: as pessoas tinham o mesmo senso de progresso quando o primeiro fio telegráfico foi conectado ou quando o primeiro telefonema foi feito. Daqui a 50 anos nossa tecnologia vai parecer da “idade da pedra”.
Além do mais, as pessoas que criam essas invenções possuem a mesma natureza caída de sempre.
Elas têm os mesmos problemas fundamentais, as mesmas deficiências morais, as mesmas inseguranças básicas que os seres humanos sempre tiveram.
Isso explica por que a história parece não estar levando a nada, porque ela parece andar em círculos e não em linha reta, como a roda na gaiola do hamster.
O que vemos agora é o que as pessoas têm visto no passado e o que elas verão no futuro.
O que estamos vivendo nessa pandemia, já foi visto na Peste bubônica que causou a peste negra século 14, que matou cerca 200 milhões de pessoas na Eurásia. As pandemias, da varíola, da cólera (1817), e da gripe espanhola e a Gripe Suína (H1N1) 2009. Todas elas com sintomas parecidos.
Se as pessoas acham que isso é algo novo, deixem-me citar outra vez as Escrituras. Eclesiastes diz “Nada é feito que não tenha sido feito antes“.’ QUANTO MAIS AS COISAS MUDAM, MAIS ELAS PERMANECEM IGUAIS.
E sempre que algo parece ser realmente novo debaixo do sol, isso se deve apenas ao fato de termos esquecido oque aconteceu no passado.
O poema do Pregador sobre a repetição enfadonha da vidacom uma linha sobre a perda de memória:
“Já não há lembrança das coisas que precederam; e das coisas posteriores também não haverá memória entre os que hão de vir depois delas” (Ec 1.11).
Com que facilidade as pessoas se esquecem! O que Eclesiastes descreve aqui é um tipo de AMNÉSIA HISTÓRICA.
As pessoas não costumam conhecer bem a sua história, por isso, o que parece ser novo para nós pode, na verdade, ser algo antigo do qual nos esquecemos há muito tempo.
Por exemplo, costumamos imaginar que os Estados Unidos sejam a primeira grande civilização da América do Norte. Mas existiam povos lá antes deles surgirem — povos que amavam, e lutavam, e viviam, e morriam.
Há mais de mil anos, os anasazi construíram uma cidade grande no Cacho Canyon, no Novo México, com prédios de cinco andares e centenas de quartos.
A comunidade de Cahokia, perto da cidade de St. Louis, chegou a contar 40 mil membros foi a maior cidade na América do Norte até a Filadélfia ultrapassá-la no século 19.
Mas quem dos americanos se lembra dessas coisas hoje em dia? Algum dia, nós também seremos esquecidos.
Em alguns séculos, as experiências comuns do nosso tempo farão parte das “coisas que precederam”, mencionadas em Eclesiastes 1. O que nós acumulamos se perderá, o que realizamos será esquecido.
Nossos descendentes não se lembrarão melhor de nós do que nós nos lembramos de nossos ancestrais.
Afinal, quando as coisas que ainda hão de acontecer serão esquecidas, essas pessoas também não serão mais lembradas.
A mesma “falha de memória” acontece em termos individuais. Há muitas coisas das quais não conseguimos nos lembrar — as experiências da nossa infância, nossos conhecimentos matemáticos que adquirimos no último ano de escola, o lugar em que vimos pela última vez aquilo que agora estamos procurando.
É difícil se lembrar. Em breve, a maioria de nós terá de lidar com a perda de memória que vem com a idade, quando as nossas próprias experiências se tornam inacessíveis a nós mesmos.
Ainda seremos quem somos quando esquecermos quem fomos? Ou será que a última lembrança de nós também se perderá? O fato de que não há lembrança de coisas passadas faz parte da fadiga da vida.
- Tudo se faz novo.
“Vaidade de vaidades!”. “Todas as coisas são cheias de fadiga!”. Você está começando a concordar com a filosofia de vida do Pregador?
Você ainda acha que há algum lucro em todo seu trabalho, ou sua ladainha de fracassos já o convenceu de que a vida nada mais é do que labuta e problemas?
Aqui, é crucial entender o propósito do Pregador. Há uma razão pela qual ele quer que sintamos todo o peso da fadiga e da futilidade da vida debaixo do sol.
“A função de Eclesiastes”, é levar-nos e ao ponto em que começamos a questionar seriamente a verdadeira razão do viver.
Se as coisas são assim, se tudo estiver morrendo. Nós nos deparamos com a inferência terrível de que nada tem sentido, nada importa debaixo do sol.”
No entanto, a história não acaba por aqui. Lembre-se de que as coisas serão apenas assim se as contemplarmos “debaixo do sol”.
Essa expressão, que ocorre aqui no versículo 3 e novamente no versículo 9, bem como em dezenas de outros pontos em Eclesiastes, é uma das chaves para a compreensão do livro.
Ela expressa em parte a extensão do nosso problema. Onde experimentamos a futilidade e frustração da vida?
Em toda parte do mundo — em todos os lugares em que brilha o sol. Essa expressão, porém, também deixa em aberto a possibilidade de umaperspectiva diferente.
Quando diz “debaixo do sol”, o Pregador “exclui todos os valores superiores e todas as realidades espirituais e aplica apenas os recursos e dons que este mundo oferece.
O uso dessa expressão é equivalente a traçar uma linha horizontal entre as realidades terrenas e celestiais”.
1° Contemplar as coisas “debaixo do sol” significa, então, vê-las do chão. Significa assumir um ponto de vista terreno, por ora deixando Deus de fora.
Mas, evidentemente, essa não é a única maneira de ver as coisas, não é nem mesmo a maneira correta de fazê-lo.
Existe um Deus no céu que reina sobre o sol. Portanto, não somos limitados ao terreno; por meio da revelação da Palavra de Deus podemos ver as coisas também do ponto de vista celestial.
A razão pela qual o Pregador nos mostra a fadiga da nossa existência, tornando-nos cada vez mais desiludidos com a vida debaixo do sol, é para que não esperemos encontrar sentido e satisfação nas coisas terrenas, mas apenas em Deus.
A estratégia do Pregador é nos faz sentir o gosto amargo do absinto dos prazeres mundanos, diante da fonte celestial.
Para que mostremos aos pecadores o mundo de vaidades que deixamos para traz, e apontar para a gloria e os prazeres do mundo novo que encontramos em Cristo.
Isso não significa que, se acreditarmos em Deus, todos os nossos problemas terminarão ou que nunca mais sentiremos a fadiga e a vaidade da vida debaixo do sol.
Por um lado, os cristãos muitas vezes se esquecem de lembrar de Deus, e quando isso acontece, voltamos imediatamente para “DEBAIXO DO SOL”.
(a) Sobre o sol
Mas Eclesiastes abre a possibilidade para uma perspectiva “SOBRE O SOL”, que pode trazer alegria e refresco para a vida na medida em que aprendemos que tudo importa.
Uma maneira de ver isso é pegar todas as coisas que tornam a vida enfadonha — todas as repetições cansativas na natureza e na experiência humana — e ver que diferença isso faz quando trazemos Deus de volta para tudo isso.
O que acontece quando levamos a vaidade de todas essas vaidades para o Santo dos Santos e a contemplamos do ponto de vista de Deus?
O Pregador olha para o mundo natural e não consegue reconhecer qualquer progresso.
Mas existe outra perspectiva. O salmista diz: “Os céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia as obras das suas mãos” (S1 19.1).
Para provar seu argumento, ele olha para o mesmo e velho sol e diz que “como noivo que sai dos seus aposentos, se regozija como herói, a percorrer o seu caminho” (SI 19.5).
Não importa se o sol parece fazer qualquer progresso ou não, ele testifica a alegria e a força de seu Criador. Por isso: “Do nascimento do sol até ao ocaso, louvado seja o nome do SENHOR” (S1 113.3).
A repetição que vemos na natureza é testemunho da bondade e ordem de Deus. A regularidade do mundo criado demonstra a constância de seu Criador.
O vento sopra a seu mando, as águas correm conforme a sua ordem, e tudo isso acontece para o bem de cada criatura.
As Escrituras dizem: “Pões nas águas o vigamento da tua morada, tomas as nuvens por teu carro e voas nas asas do vento” (SI 104.3; cf. 147.18).
Assim, em vez de ver as rotinas diárias da natureza como o pregador as viu, podemos vê-las corno Jeremias as viu quando disse:
“As misericórdias do SENHOR são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim; renovam-se cada manhã. Grande é a tua fidelidade” (Lm 3.22-23).
(b) Tudo novo.
Olhar “sobre o sol” também nos dá urna perspectiva diferente para as nossas experiências. EXISTE ALGO NOVO? Talvez não debaixo do sol, mas o Deus que reina sobre o sol sempre está fazendo algo novo.
Há uma “nova aliança” no sangue de Jesus Cristo (Lc 22.20) — o sangue que ele derramou na cruz para o perdão dos nossos pecados.
Há a nova vida que surgiu do túmulo vazio quando Jesus ressuscitou dentre os mortos com o poder da salvação eterna.
Há o “novo coração” que Deus dá a todos que creem em Jesus (Ez 36.26).
Há o “novo homem” que o Espírito Santo começa a cultivar no conhecimento e na santidade de Deus (Ef 4.24).
Esse novo homem é tão novo que a Bíblia o chama de “nova criatura” (2Co 5.17), que é uma maneira de dizer que quando confiamos em Deus, sua obra em nós recriará todo o nosso mundo.
A vida cristã não é o “mesmo de sempre”. o Deus vivo, que está sentado no trono do universo, diz: “Eis que faço novas todas as coisas” (Ap 21.5).
É esta a promessa à qual devemos nos agarrar quando nos cansamos da vida e de seus problemas. O Deus que adoramos é o Deus que diz: “Eis que faço coisa nova” (Is 43.19).
Algum dia, Deus fará novos céus e uma nova terra. Nem todos creem nisso, é claro. Na verdade, a Bíblia diz que algumas pessoas negam o juízo vindouro e a salvação final porque acreditam que “todas as coisas permanecem como desde o principio da criação” (2Pe 3.4).
O que elas dizem se parece muito com Eclesiastes: “Não há nada novo debaixo do sol”. Mas a Bíblia promete que, quando este mundo velho e cansado for destruído, Deus fará “novos céus e nova terra” (2Pe 3.13).
Essa promessa dá esperança ao povo de Deus e nos capacita a perseverar mesmo quando estivermos cansados. As frustrações da vida não permanecerão para sempre; vivemos na esperança de um novo dia.
Os justos brilharão como o sol, no reino de Deus, e não “debaixo do sol”.
Quando vier o grande dia, nossos ouvidos inquietos e nossos olhos vagantes serão finalmente e completamente satisfeitos ao verem Jesus Cristo e ao ouvirem o som de sua gloriosa adoração.
“Nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano”, é isso “o que Deus tem preparado para aqueles que o amam” (1Co 2.9).
Não olharemos mais para este ou aquele lado à procura de algo que nos satisfaça, pois nossos sentidos se saciarão com a glória de Deus.
Devemos nos lembrar disso sempre que nos sentimos frustrados, irritados, tristes ou decepcionados com algo na vida que esteja quebrando, fracassando ou caindo aos pedaços.
Lembre-se de que esta vida não é nossa existência final. Fomos feitos para um mundo melhor. O fato de estarmos cansados da vida nos aponta para o único Deus que pode satisfazer a nossa alma.
Tudo isso nos leva de volta para a pergunta que o Pregador fez no início: “Que proveito tem o homem de todo o seu trabalho, com que se afadiga debaixo do sol?” (Ec 1.3). A resposta aqui é: NADA.
Conclusão:Mesmo que Salomão queira que seus leitores entendam que a vida debaixo do sol é um presente de Deus e deve ser aceita e aproveitada como tal, ele faz tudo para nos mostrar que a vida vista apenas por essa perspectiva nunca parece fazer sentido.
A expressão “debaixo do sol” ressalta repetidas vezes a futilidade e a falta de sentido da vida vivida apenas para aqueles que vivem egoisticamente e sem gratidão ou respeito por Deus e seus caminhos.
No entanto, a pergunta pelo LUCRO OU GANHO continua sendo uma boa pergunta: Sabemos disso porque Jesus expressou essas coisas quase que exatamente da mesma forma: “O que ganhará o homem?” Ele perguntou.
Só que Jesus virou toda a pergunta de ponta cabeça. Ele não perguntou o que no mundo nós ganharíamos por todo nosso trabalho.
Em vez disso, perguntou o que realmente ganharíamos se tivéssemos o mundo inteiro:
“que aproveitará o homem se ganhar o mundo inteiro e perder sua alma?”(Mt 16.26; cf. Mc 8.36).
A IMPLICAÇÃO É QUE NEM MESMO O MUNDO INTEIRO BASTA PARA COMPENSAR A PERDA DA ALMA ETERNA.
Se tivermos buscando um LUCRO, não devemos estar vivendo por aquilo que o mundo parece nos oferecer, mas apenas pelo GANHO ETERNO que vem quando confiamos em Jesus pela dádiva gratuita da vida eterna.
[1]Contemporary English Version
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