Sermão Nº 21 – O último sermão – Referência João 12:1-50

INTRODUÇÃO:

A hora decisiva havia chegado. A festa da Páscoa estava nos seus últimos preparativos. Só faltavam seis dias, quando Jesus sai de Efraim e vai para Betânia.

Enquanto em Jerusalém a morte de Jesus está sendo tramada nos bastidores do poder eclesiástico, em Betânia uru jantar está sendo preparado para honrá-lo no aconchego de um lar.

O Sinédrio já havia decretado que, se alguém soubesse do paradeiro de Jesus, deveria denunciá-lo (11.57), mas, em vez de tratá-lo corno um criminoso, os amigos de Jesus em Betânia lhe preparam uma ceia.

Jesus é recebido para um jantar, possivelmente na casa de Simão, o leproso, mesmo sabendo da trama do Sinédrio para prendê-lo e matá-lo.

Depois do jantar em Betânia, Jesus entra publicamente em Jerusalém, sendo saudado pela multidão. Enquanto os fariseus o rejeitam, os gregos querem vê-lo.

Jesus fala abertamente sobre sua glorificação pela morte, e os judeus revelam uma rejeição aberta ou uma fé insuficiente.

Aqui encerra o ministério público de Jesus. Daqui para a frente, ele vai endereçar seu ensino apenas a seus discípulos. Este texto também é uma lição de como reagimos pregação e seriedade que é ouvir a mensagem do Evangelho.

  1. A DEVOÇÃO DE MARIA (12.1-3,7,8)

Essa é a terceira vez que Maria está aos pés de Jesus. Na primeira vez, esteve aos pés de Jesus para aprender (Lc 10.39); na segunda, prostrou-se aos pés de Jesus para chorar (11.32).

Dessa feita, demonstra a ele seu acendrado amor por intermédio de uma generosa oferta (12.3). Esse episódio ocorre numa terça-feira, seis dias antes da Páscoa, na casa de Simão, o leproso (Mc 14.6).

Não sabemos ao certo se esse Simão era o pai dos três irmãos de Betânia, o marido de Marta, ou simplesmente um amigo da família. Tanto Marta quanto Maria demonstram sua devoção a Cristo.

Marta expressa sua consideração e afeição a Jesus mediante os pratos que preparou e colocou à mesa; Maria derrama um precioso perfume sobre a cabeça e os pés do seu Senhor.

O texto em apreço apresenta um contraste. Dessa feita, o contraste não é entre Maria e Marta (Lc 10.38-42), embora as peculiaridades das duas irmãs ainda estejam em evidência.

O contraste agora é entre Maria e Judas Iscariotes. A avareza disfarçada de amor aos pobres deste e a oferta sacrificial daquela estão em flagrante oposição.

Aos motivos de Maria contrapõem-se a falácia e a avareza do ladrão e traidor. Vale ressaltar que o gesto de Maria violou vários clichês culturais.

Ela ofereceu o seu melhor a Jesus sem se importar com o protocolo, a etiqueta ou as regras culturais. Que regras ela violou?

Primeiro, a sociedade esperava que, como mulher, ela estivesse servindo.

Segundo, tocar os pés de outra pessoa era considerado algo degradante, feito por escravos rasos.

E, terceiro, Maria não apenas tocou os pés de Jesus, mas também os enxugou com os seus cabelos, sendo estes a coroa e a glória da mulher. O gesto de soltar os cabelos em público era indigno para uma mulher naquele tempo.

Quarto, o caro perfume que ela derramou sobre os pés de Jesus era um tesouro que as mulheres guardavam para as suas próprias bodas.

Mesmo quebrando paradigmas, o gesto de Maria, embora censurado pelos homens, foi enaltecido por Jesus.

Destacaremos alguns aspectos da devoção amorosa de Maria.

  1. Maria deu o seu melhor (12.3). Os evangelistas Marcos e Mateus não nos informam o nome da mulher que ungiu Jesus, mas João nos conta que foi Maria de Betânia, a irmã de Marta e Lázaro (12.1-3).

Jesus estava na casa de Simão, o leproso, na cidade de Betânia, participando de um jantar.

A descrição das irmãs de Lázaro — Marta servindo e Maria cultuando — novamente chama a atenção por sua semelhança com o retrato que Lucas traça no único trecho em que as menciona (Lc 10.38-41).

Esse jantar possivelmente foi motivado pela gratidão de Simão e Maria. Esta, num gesto pródigo de gratidão e amor, quebrou um vaso de alabastro e derramou o preciosíssimo perfume sobre a cabeça de Jesus.

O perfume havia sido extraído do puro nardo, isto é, das folhas secas de urna planta natural do Himalaia, entre o Tibete e a índia.

Pelo fato de a planta provir de uma região tão remota e ser transportada no lombo de camelos através de regiões montanhosas, era altamente cotada.

  1. Maria deu sacrificialmente (12.3). O gesto de amor e adoração de Maria foi público, espontâneo, sacrificial, generoso, pessoal e desembaraçado.

A libra de bálsamo equivalia a uns 327 gramas de perfume. Cada grama desse perfume excelente valia um denário. O total desse caro unguento equivalia ao salário de um trabalhador comum durante um ano inteiro.

Maria deu não apenas o seu melhor, mas deu, também, sacrificialmente. Aquele perfume foi avaliado por Judas em 300 denários (12.4,5).

Representava o salário de um ano de trabalho. Assim como Davi, Maria se recusou a dar ao Senhor o que não lhe havia custado coisa alguma (2Sm 24.24).

Judas Iscariotes fica indignado com Maria e considera seu gesto um desperdício. Ele culpa Maria de esperdiçar e administrar mal os recursos. Murmura contra ela, dizendo que aquele alto valor deveria ser dado aos pobres.

Judas criticou Maria por desperdiçar dinheiro, enquanto ele desperdiçou a própria vida.

Essa é a grade característica do amor ele dá. O amor não é calculista; o amor esbanja! O amor, depois de dar tudo, só lamenta não ter mais para dar! O amor é extravagante, sempre excede!

  1. Maria buscou agradar somente ao Senhor (12.7). Maria demonstrou seu amor a Jesus de forma sincera e não ficou preocupada com a opinião das pessoas à sua volta.

Não buscou aprovação ou aplauso das pessoas nem recuou diante das suas críticas.  A devoção de Maria contrasta vivamente com a malignidade dos principais sacerdotes e a vil traição de Judas.

  1. Maria demonstrou amor em tempo oportuno (12.7). Muitos perdem a oportunidade de demonstrar gratidão as pessoas enquanto elas vivem, por isso a dor do remorso é sempre maior que a gratidão.

Maria demonstrou seu amor generoso a Jesus antes de sua morte e antecipou-se a ungi-lo para a sepultura (Mc14.8).

As outras mulheres também foram ungir o corpo de Jesus, mas, quando chegaram, ele já não estava lá, pois havia ressuscitado (Mc 16.1-6).

Muitas vezes, demonstramos o nosso amor tardiamente. A mais eloquente declaração do amor de Davi por seu filho Absalão ocorreu depois da morte do filho.

Absalão sempre quis ouvir isso de seu pai, mas, quando Davi declarou seu amor a ele, Absalão já não podia mais ouvir.

Muitas vezes, enviamos flores depois que alguém morre, quando a pessoa já não pode mais sentir seu aroma.

  1. Maria foi elogiada pelo Senhor (12.7,8). Jesus chamou o ato de Maria de boa ação (Mc 14.6) e disse que seu gesto deveria ser contado no mundo inteiro, para que sua memória não fosse apagada (Mc 14.9).

E isto é uma grande verdade, hoje estamos contando a história dela, que nos serve de ensino e exemplo.

Jesus diz que os pobres precisam ser assistidos, mas eles estão sempre entre os homens; ele, porém, morreria nessa mesma semana, e apenas Maria discerniu esse fato para honrá-lo antecipadamente.

  1. A HIPOCRISIA DE JUDAS (12.4-6)

O pródigo amor de Maria é contrastado com a avareza hipócrita de Judas Iscariotes. A esse respeito, destacamos dois pontos.

  1. A falsa filantropia de Judas Iscariotes (12.4,5).

Judas Iscariotes fica irritado com o gesto pródigo de Maria e justifica sua exasperação com o argumento de que o dinheiro despendido nesse caro perfume poderia socorrer muitos pobres.

A cobiça e a avareza de Judas por coisas materiais se disfarça aqui em altruísmo. Judas Iscariotes já havia sido identificado por Cristo como aquele que haveria de traí-lo (6.71), mais agora João o chama de traidor (12.4).

E todas as vezes que ele é mencionado nos Evangelhos ele é sempre identificado como aquele que seria o traidor. Todas as suas palavras e ações são vistas à luz desse fato.

Isso mostra que um comportamento de uma pessoa, está identificado logo cedo, em suas palavras e ações. A falta de caráter aparece até mesmo quando alguém insiste em expressar espiritualidade, disfarçando a verdadeira motivação.

  1. A hipocrisia desmascarada de Judas Iscariotes (12.6). Judas criticou a atitude de Maria. A motivação de Judas Iscariotes em se preocupar com tanto dinheiro gasto na unção de Jesus não era com o cuidado dos pobres.

Como tesoureiro que era, e guardador dos recursos do ministério de Jesus, ele roubava dinheiro do caixa da igreja de Jesus. Judas não era um filantropo, mas um ladrão. Não era um defensor dos pobres, mas um avarento desonesto.

Por trás das palavras de Judas, havia um espirito mercenário, e não um interesse altruísta pelos pobres. Judas não só contabilizava o que as contribuições que entrava; mas também se apropriava indevidamente do dinheiro.

Esse é o único lugar no Novo Testamento em que Judas Iscariotes é chamado de ladrão.

Jesus não estava dizendo que não devemos ajudar os necessitados, mas ao repreender a Judas, ele demonstra que o custo com a devoção a ele é mais importante do que a ajuda que damos aos pobres.

Jesus está dizendo que sempre teremos pobres, e que aquele dinheiro não ia resolver o problema da pobreza no mundo.

Alguns desavisados e por motivações avarentas e hipócritas; acreditam que seria melhor dar cesta básica, do que dá o dizimo e ofertas na igreja.

Neste incidente e em toda a Escritura, fica evidente que Deus coloca a nossa devoção acima da nossa filantropia. Primeiro o reino de Deus e depois a outras coisas.

III. O PRECONCEITO HOSTIL (12.9-11)

Ao mesmo tempo que Jesus é honrado em Betânia, os principais sacerdotes resolvem matá-lo. A hostilidade deles não tem limites.

Querem matar também Lázaro, porque este era uma testemunha viva e eloquente do poder de Jesus. A vida de Lázaro era um sermão poderoso e irrefutável.

Se Lázaro permanecesse vivo, seria impossível abafar a verdade incontroversa do poder incomparável de Jesus.

Lázaro se tornou um foco para as conspirações dos sumos sacerdotes. A vida dele dava base para a fé em Jesus; portanto, ele também tinha de ser destruído.

Lazaro não estava dando testemunho do que ele possivelmente viu no mundo dos mortos. As pessoas estavam lá não para “ouvi-lo” mas para, e sim para “vê-lo“.

Por um lado Maria foi criticada por Judas, mas o seu irmão Lázaro, foi alvo de ódio dos líderes religiosos, pois ele era uma testemunha singular do poder de Cristo, e este milagres levou muitos a crerem em Jesus. Eis aqui o verdadeiro propósito do milagre, levar as pessoas a crer em Cristo.

As verdadeiras testemunhas de Cristo são sempre alvas do ódio de seus inimigos. Então resolveram matar Jesus e também Lázaro.

Eles eram uma ameaça política. Os saduceus eram a aristocracia endinheirada entre os judeus que cuidavam dos negócios do templo.

Os sacerdotes eram saduceus. Ao mesmo tempo que cuidavam do sacerdócio, formavam também um partido político religioso que estava no poder.

Seu interesse era assegurar a própria riqueza. Eles ganhavam com o comercio do templo e com as ofertas e doações do povo.

A segunda razão era movida pelo PRECONCEITO TEOLÓGICO. Os saduceus não criam em milagres, Deus só operou milagre no tempo do antigo testamento, logo não acreditavam na ressurreição dos mortos.

A ORTODOXIA MORTA dos teólogos saduceus, impediam de crer no milagre da ressurreição de Lázaro, mesmo que tivesse vivo. Essa desavença teológica produziu incredulidade e ódio, que vai levar a morte de Jesus.

A ressurreição de Lázaro, jogava uma pá de cal sobre a ortodoxia estéril que eles professavam. Então agiram conforme o padrão histórico, de todos os que a professam, condenam a morte.

 

  1. A ENTRADA TRIUNFAL (12.12-19)

Da tranquilidade de um jantar em Betânia, João muda a cena para a agitação e o barulho de um cortejo na entrada de Jerusalém.

Esse episódio é registrado pelos quatro evangelistas e é a única manifestação pública que Jesus admitiu durante o seu ministério.

Seu propósito era cumprir a profecia do Antigo Testamento (Zc 9.9).19 Essa era a hora mais esperada do ministério de Jesus.

Aqui se cumpria seu desejo e propósito eterno. Ele veio para morrer e, agora, estava entrando triunfalmente em Jerusalém para cumprir esse plano eterno do Pai.

A festa da Páscoa era o prazer dos judeus e o desespero dos romanos[1]. Era uma festa para judeus e o medo de uma revolta para os romanos. Nessa festa, a população de Jerusalém, que girava em torno de cinquenta mil pessoas, era cinco vezes maior.

O texto em tela enfatiza seis realidades.

  1. A consumação de um propósito eterno (12.12,13). A vinda de Jesus ao mundo foi um plano traçado na eternidade. Deus Pai o enviou, e ele voluntariamente obedeceu à vontade do Pai.

Jesus veio para dar sua vida. Agora havia chegado o grande momento. Não houve nenhuma improvisação. Nenhuma surpresa. Ele veio para esta hora. E essa hora havia chegado!

De todos os testemunhos que João descreve para apresentar Jesus como o Messias, esse se destaca de modo especial.

Assim como Salomão foi ungido rei e depois montado em um jumento é aplaudido pelo povo. No seguinte em que Jesus foi ungido em Betânia, ele foi recebido como rei em usa entrada triunfal na cidade santa.

Todos os outros evangelistas registram este evento. Mas somente João dá testemunho de que a multidão em festa o recebeu como o messias prometido.

Clamando: Hosana! Bendito seja o que vem em nome do Senhor, citavam um salmo que todos os judeus consideravam conter uma predição do Messias que havia de vir (SI 118.26).

  1. A apresentação humilde de Jesus (12.14,15). A entrada de Jesus em Jerusalém foi externamente despretensiosa. Ele não entrou cavalgando um cavalo fogoso, brandindo uma espada nem acompanhado de um exército.

Não veio como um conquistador político, mas como o redentor da humanidade. A entrada triunfal de Jesus em Jerusalém foi totalmente diferente daquelas celebradas pelos conquistadores romanos.

Quando um general romano retornava para Roma depois de sua vitória sobre os inimigos, era recebido por grande multidão. O general vitorioso desfilava em carruagem de ouro.

Os sacerdotes queimavam incenso em sua honra, e o povo gritava seu nome, enquanto seus cativos eram levados para as arenas a fim de lutarem com animais selvagens. Essa era a entrada triunfal de um romano.

Ao montar um jumentinho, porém, Jesus estava dizendo que sua missão era de paz e que seu reino era espiritual. Estava cumprindo a profecia de Zacarias:

Alegra-te muito, ó filha de Sião; exulta, ó filha de Jerusalém; o teu rei vem a ti; ele é justo e traz a salvação; ele é humilde e vem montado num jumento, num jumentinho, filho de jumenta (Zc 9.9).

Sem um claro entendimento da cultura antiga[2] dos judeus e da cerimônia do templo, perdemos a beleza e o poder dessa manifestação de Jesus.

Na festa da Páscoa, todos os cordeiros vinham de Belém. O sumo sacerdote descia de Jerusalém para Belém a fim de encontrar o cordeiro perfeito para o sacrifício.

Ao encontrá-lo, seguia para Jerusalém no quarto dia antes da Páscoa, ou seja, na quarta-feira. Quando entrava pelo portão do templo, o povo se reunia com folhas de palmeiras para celebrar ao Senhor, clamando:

“Hosana ao cordeiro de Deus que tira de nós o nosso pecado”.

Esse fato explica por que havia uma multidão no portão, com folhas de palmeiras e ramos nas mãos, quando Jesus entrou (Mt 21).

A multidão foi ao encontro de Jesus (12.18). Aqui, mais uma profecia se cumpre. Jesus é o cordeiro perfeito, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo (1.29).

Jesus é o mesmo que realizou os milagres que só o Messias poderia operar. Jesus é aquele que falou as verdades que só o Messias poderia falar.

Jesus entrou montando num jumentinho (Zc 9.9). No mundo antigo, quando um rei ia a um país vizinho em missão de paz, vinha montado num jumento; contudo, se o motivo era fazer guerra contra aquela nação, ia montado num cavalo.

E maravilhoso perceber que, na sua primeira vinda, Jesus entrou em Jerusalém montado num jumentinho, pois veio para nos trazer salvação e paz.

Contudo, em sua segunda vinda, quando virá para trazer juízo às nações, entrará montado num cavalo branco (Ap 19.11).

A vinda do rei humilde está associada ao fim da guerra: isso, também, foi entendido por João como definidor da obra de Jesus, de tal forma que este nunca poderia ser reduzido a um zelote fanático.

A vinda do rei humilde está associada à proclamação de paz às nações, estendendo seu reino aos confins da terra (Zc 9.10; SI 72.8).

A vinda do rei humilde está associada ao sangue da aliança de Deus que resulta em libertação para os prisioneiros — termos já preciosos para João (1.29,34; 3.5; 6.35-58; 8.31-34) — e associados à Páscoa e à morte do servo-rei que está imediatamente à frente.

  1. A exaltação pública de Jesus (12.13).

Tanto a multidão que estava em Jerusalém como aquela que o acompanhava à cidade santa, proclamava-o como o Messias, com vozes de júbilo. Essa proclamação focou duas verdades importantes:

  1. a) Apontou Jesus como o Salvador A multidão gritou: Hosana! Bendito o que vem em nome do Senhor! Bendito o rei de Israel! A palavra “Hosana” é um clamor pelo Salvador, cujo significado literal é: “Dê a salvação agora”.
  2. b) Apontou Jesus como o rei, Jesus é o rei e, com ele, chegou seu reino. Os reinos do mundo levantam-se e caem, mas o reino de Cristo jamais passará. Jesus é maior do que Davi. Davi inaugurou um reino terreno e temporal, mas o reino de Cristo é celestial e eterno.
  3. A rejeição dos fariseus (12.19). Os fariseus escarneceram da multidão que exaltava Jesus e, em uma linguagem hiperbólica e cheia de desprezo, disseram: Vede que nada conseguistes! O mundo inteiro vai atrás dele!

João finaliza a narrativa[3] salientando um ponto que não é apresentado nos outros evangelhos.  Ele continuamente contrapõe as manifestações da fé ás da incredulidade.

Ele mostra que a crença do povo se deve, principalmente, ao “milagre” da ressurreição de Lázaro, e que a popularidade sem precedentes de Jesus só faz incitar seus inimigos, as autoridades, a adotarem o mais depressa possível a sugestão extrema de Caifás e levar a cabo a morte de Cristo.

A cena estava carregada de potencial explosão[4]. Jesus podia ter começado uma revolta armada exatamente naquele momento. Os fariseus observavam as multidões, inquietos.

Embora menos acomodados aos senhores romanos que os saduceus, eles pensavam que o caminho da sabedoria era suportar a ocupação e se aborreciam com a crescente popularidade de Jesus.

O Sinédrio tomou sua decisão (11.49-53), mas teve de executá-la furtivamente por causa das multidões?

 

  1. A BUSCA DOS GREGOS (12.20-36)

Na mesma medida em que os fariseus rejeitavam decisivamente a Jesus, os gregos buscavam Jesus (12.20-22). Enquanto o povo da aliança rejeita o Messias, os gentios queriam vê-lo.

Os gregos abordam a Felipe, talvez isso se deva ao fato de seu nome ter origem grega. Ou talvez por serem da região gentílica de Decápolis, na Galileia.

Provavelmente, esses gregos eram forasteiros que ocasionalmente subiam a Jerusalém para adorar nas festas (como o eunuco etíope em Atos 8.27), ou mesmo viviam na Galileia como prosélitos.

O que importa é que, enquanto o povo da aliança rejeitou Jesus, eles, como gentios, procuravam o mestre. Filipe leva o caso a André, que o comunica a Jesus.

André é o homem que sempre aparece levando alguém a Cristo. Ele levou Pedro, seu irmão, a Cristo; também levou o menino com cinco pães e dois peixes a Jesus. E, agora, está levando a pergunta dos gregos a Jesus.

O momento é cercado de dramaticidade. Os discípulos têm plena consciência da trama armada pelas autoridades judaicas para matarem Jesus.

Esse desejo dos gregos de verem Jesus poderia soar como um escape. Não seria uma saída para Jesus e seus discípulos, pois os próprio judeus já haviam sugerido que ele poderia se esconder entre os gregos (7.35)?

Talvez esteja aqui a explicação do porquê Jesus não atendeu os gregos, para evitar que seus discípulos fossem excitado com a ideia de afastar por um tempo até que a poeira baixasse e o ódio dos líderes religiosos aplacasse.

Em vez de Jesus conceder uma entrevista aos gregos, como era seu desejo, ele aproveitou para dar um profundo esclarecimento acerca de sua glorificação, pelo sacrifício de sua morte e pela exaltação de sua ressurreição.

Destacamos a seguir aqui alguns pontos.

  1. A hora de Jesus ser glorificado chegou (12.23). Jesus responde aos gregos: Chegou a hora de ser glorificado o Filho do homem.

Essa hora da qual Jesus falou várias vezes havia enfim chegado. A agenda feita na eternidade tornar-se-ia história. O ponto culminante de seu ministério chegou.

Jesus, estritamente falando, não atende ao pedido direto dos gentios, mas à situação que o pedido deles representa.

No exato momento em que as autoridades judaicas estão se voltando mais violentamente contra ele, alguns gentios começam a clamar por sua atenção.

Nessa instância, entretanto, a abordagem dos gregos é para Jesus um tipo de GATILHO, um sinal de que a hora do ápice já raiou.

Agora, dramaticamente, o pedido dos gregos muda os parâmetros. Desse momento até a Paixão, a hora está em perspectiva imediata (12.27; 13.1; 17,1).

  1. A cruz é o palco da glorificação (12.24-26).

A ligação que Jesus faz entre glorificação e crucificação é fundamental para se entender a redenção.

A morte e a ressurreição de Jesus não são divididas em derrota no Calvário e subsequente vitória na ressurreição. Em vez disso, juntas, morte e ressurreição representam um único e inseparável evento em que Jesus traz glória ao nome de Deus.

A cruz é a força de atração em que Jesus uniria todos os povos, tanto judeus, como gregos representados as nações.

No pedido dos gregos, Jesus vê sua semente, isto é, numerosa posteridade espiritual. Isso fora prometido ao Messias como o fruto de seu sacrifício voluntário: Quando sua alma fizer a oferta pelo pecado, ele verá SUA SEMENTE (Is 53.10, ARA).

À parte seu sacrifício voluntário, Jesus nada podia fazer por esses gregos. A parte a cruz, não existe nenhuma colheita espiritual, Jesus ilustra sua morte com uma linguagem agrícola.

O grão só pode viver e multiplicar-se caso primeiro seja lançado na terra para morrer. Ao morrer, renasce para uma nova vida e para uma extraordinária multiplicação.

Se o grão não morrer, fica só e não pode se multiplicar nem alimentar multidões. Amar a vida a ponto de preservá-la é perdê-la, mas perdê-la é preservá-la para a vida eterna.

Aqueles que entregam sua vida ao serviço de Deus, como Jesus a entregaria em breve na cruz, serão honrados pelo Pai. A glorificação não é apenas um resultado da cruz.

Jesus disse: E eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a mim. A palavra “todos” aí referem-se a todos aqueles que crer. A cruz ainda hoje é o supremo magneto moral do mundo.

A morte de Cristo é o cumprimento das profecias, o tema central do Novo Testamento, o principal propósito da encarnação, o constante tema de seu ensino, o tema central da pregação dos apóstolos, o eixo principal do ensinamento das Epístolas, o coração das ordenanças da igreja e o assunto de supremo interesse no céu.

  1. A angustia da Cruz (12.27). Mesmo sendo a cruz o palco fulgurante da glorificação do Filho e da manifestação da glória do Pai, é também urna arena de amarga angústia.

Ali Jesus não apenas sofreu as agruras do sofrimento físico, mas enfrentou a maldição do pecado e o afastamento do Pai. Sua alma está angustiada, mas Jesus não recua sequer um milímetro.

Ele sabe que veio para essa hora, e essa hora havia chegado. Portanto, mesmo com a alma esmagada pela angústia, ele caminha para a cruz corno um rei caminha para sua coroação.

Ele faz a mesma oração que vai repetir no Getsêmani, o pavor e a angustia da cruz que o cerca e sua obediência a vontade de Deus.

  1. O clamor profundo de Jesus (12.28). À sombra da cruz, o desejo mais intenso de Jesus não é escapar do sofrimento, mas glorificar o Pai e fazer sua vontade.

E por isso ele clama: Pai, glorifica o teu nome! […]. A resposta é imediata. Do céu vem uma voz: […] Já o glorifiquei, e o glorificarei mais um vez.

O Pai já havia sido glorificado pela vida, pelo ensino e pelas obras de Jesus, mas ainda seria glorificado pela sua morte e ressurreição. O anelo do Filho é glorificar o Pai, e o anelo do Pai é ser glorificado no Filho.

O servo que não faz a própria vontade, mas realiza a vontade daquele que o enviou — mesmo até a morte de cruz —, esse é o que glorifica a Deus.

  1. O ceticismo e o misticismo da multidão (12.29,30).

Quando a multidão ouviu a voz do céu, dividiu-se em dois grupos. O primeiro era formado pelos céticos. Diziam ter ouvido um trovão. Esses são aqueles que tentam interpretar as verdades espirituais apenas como fenômenos naturais. O segundo grupo era formado pelos místicos.

Eles diziam: “Foi um anjo que lhe falou”. Esses até acreditaram que algo sobrenatural havia acontecido, mas não entenderam que a voz do céu era do próprio Deus. Jesus esclarece para os dois grupos que aquela voz não viera do céu por sua causa, mas por causa deles.

  1. As implicações da Cruz (12.31-33).

A paixão/glorificação do Filho é a hora de este mundo ser julgado (12.31). O mundo pensou que estava julgando Jesus não só enquanto debatia, perpetuamente, sobre quem ele era (6.14,42,60; 7.15; 8.48,52,53; 9.29; 10.19; 11.37), mas, de forma culminante e derradeira, na cruz.

Na realidade, porém, a cruz é que estava julgando o mundo. Para aquele que creem tema vida eterna e para os que rejeitam a perdição eterna. Pois estão rejeitando a morte do próprio Deus-homem.

A seria o julgamento deste mundo, cujo caráter moral seria nela revelado, e cujo pecado seria por ela condenado.

A paixão/glorificação é o tempo em que o príncipe deste mundo será expulso (12.31). Satanás, equivocadamente, pensava que a cruz seria o seu triunfo sobre Jesus, mas foi sua mais consumada derrota. O valente é despojado (Lc 10.18); e a cabeça da serpente é esmagada.

Qualquer poder residual que o príncipe deste mundo ainda desfrute é mais adiante restringido pelo Espírito Santo, o consolador (16.11).

  1. A cegueira espiritual da multidão (12.34).

A multidão faz menção da lei, mas fez uma leitura errada da lei. Eles têm uma expectativa irreal do Filho do homem. Na leitura míope que fizeram da lei, não havia espaço para a morte do Filho do homem; por isso, interrogam a Jesus:

Quem é esse Filho do homem? Os judeus estavam numa densa escuridão; não por falta de luz, mas por falta de discernimento espiritual. O Filho do homem é a luz, a luz do mundo, a luz da salvação.

A luz brilhava, e o povo deveria aproveitar essa oportunidade para ser salvo. Com um simples passo de fé, essa gente poderia ter passado das trevas espirituais para a luz da salvação.

  1. A INCREDULIDADE DOS JUDEUS (12.37-43)

A palavra-chave desta seção, usada oito vezes, é “crer”. Os israelitas não criam (12.37,38), não podiam crer (12.39), não deviam crer (12.40,41). Ouviram a mensagem e viram os milagres e, ainda assim, não creram.

Vamos destacar dois fatos.

  1. A incredulidade a despeito dos milagres (12.37). Jesus fez muitos milagres na presença dos judeus e cujo propósito era gerar fé e, mesmo assim, muitos deles permaneceram incrédulos.

Dessa forma, os judeus se tornaram ainda mais culpados por sua incredulidade. Não lhes faltaram evidências. A despeito das abundantes provas, fecharam o seu coração para crer.

Embora tudo o que eles esperavam fosse o messias, e tudo o que faziam tinha o propósito de manter a chama messiânica acesa; mas quando o messias veio eles não creram, pois acharam que não era aquilo que esperavam.

A explicação da incredulidade é feita por Isaias 6, por João 12 e depois  pelo apostolo Paulo em romanos 9-11.

Eles não creram, não porque eram incapazes de crer, mas porque não queriam crer. Joao diz que eles amaram mais a gloria dos homens, do que a gloria de Deus.

Essa fé completamente intelectual é realmente o clímax da incredulidade. Isso é o que João mostrou. É a mais severa acusação contra eles.

Ele disse que eles sabiam, eles acreditavam na verdade, eles tinham sido convencidos da verdade, mas eles não confessariam isso; e eles não queriam confessar isso por causa da atitude mais indigna de amar a glória dos homens do que a glória de Deus.

  1. A incredulidade é o engano do pecado (12.39-41).

A epistola aos Hebreus fala do perigo de se endurecer o coração por causa do pecado. Quando o ser humano endurece o coração, Deus o deixa endurecido,

Não há maior juízo do que Deus entregar uma pessoa a si mesma, do que Deus dar ao ser humano o que ele quer.

Os judeus não apenas não creram; eles não querem crer. A pessoa não nota que em sua incredulidade ela é tudo, menos livre; antes, está acorrentada, “não é capaz de crer”.

Ela não vê que sua resistência contra Deus a joga justamente nas mãos desse Deus, que torna seus olhos cegos e seu coração endurecido, de modo que já não há volta nem salvação,

Se a pessoa se endurece então; Deus cega seus olhos e endureceu o coração para não se converter e ser salva. Deus dá prova claras para o que creem e obscurece para os que não creem.

O mesmo que Deus fez com o faraó. Faraó endureceu, então Deus o endureceu. Deus não o endureceu, até que ele mesmo tenha se endurecido. Então, Deus selou sua própria escolha.

Paulo diz (2Ts 2.12) que as pessoas não creem porque tem prazer na iniquidade. Em Atos 28,26,27 ele explica porque ele se voltou para os gentios, porque os judeus não querem crer. A incredulidade é a escolha de não crer. É o resistir a voz do Espirito Santo.

Estevão diz na sua pregação em Atos 7.51 “Homens de dura cerviz, e incircuncisos de coração e ouvido, vós sempre resistis ao Espírito Santo; assim vós sois como vossos pais”.

Deus não está sendo arbitrário, eles estão sendo culpados a fazer e ser o que eles mesmos escolheram; eles não estão fadados a agirem assim, eles se endurecem por resistir ao Espirito Santo.

VII. A FÉ E A PREGAÇAO (12.44-50)

Esse parágrafo contém o desafio público final de Jesus às multidões, um resumo hábil dos muitos elementos de seu ensino.  Mais uma vez, a ênfase é sobre a fé.

Jesus estabelece que a fé nele é em si mesma fé em Deus, e nada mais. Inversamente, toda rejeição a Jesus é ao mesmo tempo rejeição a Deus.

Destacamos aqui dois pontos.

  1. A importância de crer (12.44-46). Depois de Jesus afirmar que não é apenas um enviado de Deus, como um profeta, mas o próprio Deus, ele diz que quem nele crê está crendo no próprio Deus.

Depois de dizer que vê-lo é o mesmo que ver Deus, Jesus afirma claramente que ele veio como luz para o mundo, a fim de que todo aquele que crer nele não permaneça nas trevas.

Todo aquele que não crê em Jesus está em trevas, mas aqueles que nele creem tornam-se filhos da luz e vivem na luz.

  1. O julgamento da Palavra (12.47-50).

Ouvir sua palavra e não a guardar é ser julgado por essa mesma palavra, porque é a própria palavra que vem de Deus.

Ouvir e guardar sua Palavra produz vida eterna; mas, ouvir e não guardar desemboca em juízo e condenação,

É assustador pensar que, em seu julgamento, o pecador será confrontado com toda e qualquer parte das Escrituras que tenha lido ou ouvido. A própria palavra rejeitada se torna seu juiz.

CONCLUSÃO:  O que a pregação produz em você?

Devoção como Maria. Hipocrisia como Judas, que apesar de ouvir o maior pregador e não se converteu.

Será que o preconceito teológico e a ortodoxia estéril impedem da pregação atingir seu coração.

Será que o engano do nosso coração esteja endurecendo silenciosamente nosso coração até ele se tornar plenamente incrédulo.

Seremos julgados por todo passagem da Escritura que ouvimos pregar; a maneira como reagimos ao sermão não é algo neutro, antes muito sério. Ouvir uma pregão é algo muito sério.

[1] Warren Wiersbe

[2] Joe Amaral

[3] Charles Erdman

[4] D. A. Carson