Sermão Nº 8 – Orando nas profundezas. Referência: Jonas 2:1-7. Pregação do Pastor Jairo Carvalho em 27/02/2019.
INTRODUÇÃO
Existem aspectos do domínio da graça que são simplesmente incompreensíveis para aqueles que vivem fora dele. Isso se manifesta em grande parte na crítica feita ao segundo capítulo de Jonas. Entre os estudiosos liberais, esse capítulo é quase sempre considerado um acréscimo editorial posterior, pela simples razão de sua mensagem não parecer crível. Argumentam que um editor posterior tentou explicar a história de que Jonas foi engolido e depois cuspido por uma baleia por meio de um salmo que parece fazer sentido. O grande argumento contra a validade desse salmo, porém, é que não se trata de um salmo de apelo e petição, mas de uma ação de graças e louvor. Jonas orou simplesmente pelo maior de todos os milagres: A salvação, e por isso ele ora um salmo de ação de graças e louvor.
- A ORAÇÃO NAS PROFUNDEZAS (v.1)
O segundo capítulo de Jonas registra uma das grandes orações da Bíblia. Isso é notável, pois até agora não tínhamos visto Jonas orando. Jonas estava fugindo da presença de Deus então ele fez duas coisas:
- Ele fugiu da oração.
Quando Deus o chamou para sua missão em Nínive, Jonas não orou para ponderar com Deus o motivo dessa chamada. Durante sua fuga para Jope, Jonas não orou por orientação. Quando comprou sua passagem no navio a caminho de Társis, ele não orou. Também não orou quando o mestre do navio veio pedir para ele orar durante grande tempestade. Isso não é coincidência, pois foi a FALTA DE ORAÇÃO que preparou a descida de Jonas para a tolice, rebelião e ruína. Jonas não orou porque não quis falar com Deus, muito menos ouvir Deus. O objetivo da fuga de Jonas era escapar “da presença do Senhor” (Jn 1.3), e a oração dificilmente teria ajudado nisso.
O mesmo vale para a nossa vida. Desobediência leva à falta de oração, a falta de oração leva à tolice e ao pecado, e a tolice e o pecado levam ao desastre. O que mudou na vida de Jonas para transformá-lo em um homem de oração? Lá no navio, ele se recusou a orar mesmo quando capitão do navio implorou a ele. Mas as coisas mudaram dentro do grande peixe. O que aconteceu? A resposta é que Deus, em sua graça, levou Jonas ao fundo do poço. Agora, no último destino de sua fuga tola, Jonas é obrigado a encarar as consequências reais. Ele está separado de Deus, da comunhão com o povo de Deus e do testemunho da Palavra de Deus. Para muitos de nós, a viagem feita por Jonas envolve toda a nossa vida — uma descida lenta, mas constante, para a escuridão. No entanto, Deus em sua graça deu a Jonas uma experiência repentina do abismo para o qual sua vida estava caminhando. Poderíamos chamar isso de trailer de um filme. E seria assim: “Lançado no mar, Jonas se viu preso, vivo, em um túmulo que era a barriga do peixe, abaixo das ondas. Por causa da libertação graciosa, que antecede a oração de Jonas, ele foi finalmente capacitado a orar”.
Philip Yancey, em seu livro que foi campeão de vendas: Decepcionados com Deus, explora a experiência de um número crescente de pessoas que expressam sua insatisfação referente aos cuidados de Deus. A fé alegre de uma jovem mãe se transformou em amargura quando sua filha nasceu com má formação. Ela descreve sobre contas médicas altíssimas e um casamento que desabou sob o estresse da doença da criança. Diferentemente de Jonas, cuja situação havia sido causada por seu próprio pecado, a vida dessa mulher havia caído no abismo simplesmente em decorrência de um parto. Após confiar em Deus, ela agora estava cheia de raiva e dúvida. Em outro caso, um homossexual escreveu a Yancey para contar-lhe do inferno de sua vida. Durante mais de uma década, ele havia procurado uma “cura” para sua orientação sexual por meio de todo tipo de tratamento, inclusive tratamento de choque. Mas nada parecia funcionar, e por fim o homem se entregou à promiscuidade e rejeitou o cristianismo. Outra mulher escreveu sobre sua depressão contínua. Na verdade, ela não tinha razões para seu desespero, mas na maioria dos dias não encontrava uma única razão para continuar a viver. Ela escreveu para dizer que havia praticamente desistido de Deus e que duvidava de que ele realmente se importava.
Esses são exemplos — bastante comuns em nossos dias — de pessoas que viram como suas vidas caíram nas profundezas e que ficaram ressentidas contra Deus. Seu ponto comum era que Deus as havia decepcionado ao não libertá-las de suas provações graves. Podemos imaginar Jonas fazendo a mesma coisa. Ele poderia ter se queixado de que Deus havia cometido um equívoco ao exigir que ele fosse pregar aos ninivitas e poderia ter alegado que sua fuga no navio com destino a Társis nada mais era do que uma reação sensata. Mas não foi o que Jonas fez. Jonas reconheceu que Deus o havia lançado no abismo e que apenas Deus era capaz de resgatá-lo. Seu reconhecimento central se encontra no versículo 3, onde Jonas diz: “Pois me lançaste no profundo, no coração dos mares, e a corrente das águas me cercou; todas as tuas ondas e as tuas vagas passaram por cima de mim”.
Jonas reconheceu que, apesar de terem sido os marinheiros que o jogaram do navio e de tudo isso ter sido sua própria ideia, foi Deus quem o lançou no abismo. Foram “tuas ondas” e “tuas vagas” que passaram por cima dele. Jonas reconheceu que tudo que acontecera com ele havia sido causado por Deus, mas também que tudo acontecera por sua própria culpa. Ele não acusa a justiça de Deus. Como ele explicou aos marinheiros: “… eu sei que, por minha causa, vos sobreveio esta grande tempestade” (Jn 1.12). Agora, ele poderia ter acrescentado: “E sei que foi por causa do meu pecado que estou morrendo neste grande peixe”. Pois além de fugir da oração ele usa outro meio de fuga.
- Usando a teologia para fugir de Deus.
Em vez de se voltar contra Deus, Jonas estava disposto a encarar a si mesmo e o seu pecado. No entanto, Jonas só se deu conta da realidade quando começou a descer para as profundezas. Antes de ser lançado nas profundezas ele tinha a doutrina certa, mas seu coração continuava errado. Foi por isso que ele se recusou a orar. Jonas usa a sua teologia para fugir de Deus. Ele defende a Soberania de Deus, Sabia que Deus criou todas as coisas; ele sabe até que Ira Divina não tolera o pecado (Jn 1.9,12). Ele reconhece que serve ao único Deus verdadeiro; mas esse conhecimento não é suficiente para salva-lo. A COSMOVISÃO de Jonas estava corretíssima, mas a sua disposição estava errada. Jonas é um como muitos crentes modernos, que tem uma DOUTRINA CERTA, mas um CORAÇÃO ERRADO. E isto explica o porquê eles tem tanta dificuldade em ter uma vida intensa de oração. Eles ficam profundamente perturbados, quando alguém ensina alguma coisa de vai de encontro a ortodoxia deles. Mas não tem o mesmo zelo quando falta as reuniões de oração. ELES TÊM UMA DOUTRINA CERTA, MAS UM CORAÇÃO ERRADO. Eles querem provar que estão certos, mas não fazem o que é certo.
Inicialmente os marinheiros que não sabia nada de Deus fez o certo, se arrependendo e o profeta que sabia tudo de Deus, fez o errado. Quem sabe não estava fazendo e que não sabia estava fazendo. Foi somente quando a escuridão final cercou Jonas, quando todas as opções haviam se esgotado, restando-lhe apenas a CONDENAÇÃO, que o coração de Jonas respondeu à sua confissão formal do pecado. Agora sua teologia não podia ajuda-lo, só Deus podia ajudá-lo, então Jonas se voltou para Deus em oração: “Na minha angústia, clamei ao Senhor”, (Jn 2.2). Obviamente, quando o homem tem para onde fugir, ele não ora a Deus, e Deus não vem até ele. Enquanto o homem conseguir inventar esperanças nos métodos teológicos e filosóficos, ele alimenta naturalmente a pretensão de que o conhecimento correto de Deus vai poder resolver seus próprios problemas. Enquanto os marinheiros tentaram salvar o navio com seu conhecimento nas habilidades náuticas, Jonas dormia. Embora todo “conhecimento” e todas as habilidades, não são ruins em sim mesmos, e são até necessários; mas eles não são suficientes para eu obedeça corretamente a Deus.Todas essas ajudas tiveram que ser destruídas, todas as soluções precisaram ser bloqueadas, e todas as possibilidades teológicas e habilidades humanas tiveram que ser superadas pelo grande desafio para fazer com que Jonas voltasse para Deus.
O contraste entre os apelos dos homens e a resposta de Deus é revelador. O capitão do navio exclamou: “Levanta-te, invoca o teu deus!” (Jn 1.6). Mas Deus fez Jonas descer e não subir para orar. É como se Deus estivesse dizendo: “Caia diante de mim, Jonas, e então serás capaz de orar”. Por mais bíblicos ou ortodoxos que sejam todo o nosso conhecimento filosófico, teológico ou todas as nossas habilidades, se tudo isso não nos colocam de joelhos de diante de Deus, pouco servem. Às vezes, a melhor coisa que pode nos acontecer é aquilo que mais tememos, pela simples razão de que isso tira de nós toda nossa AUTOCONFIANÇA, humilha nosso orgulho e remove de nós qualquer outra esperança que não a de Deus. Às vezes, isso é preciso para fazer-nos ORAR DE VERDADE. A Bíblia não especifica uma postura para a oração. Encontramos pessoas de pé e sentadas durante a oração, e ambas as posturas são apropriadas. Mas na Bíblia, como também na vida, quando homens e mulheres oram na angústia do desespero e em momentos de terrível necessidade, elas caem de joelhos diante do Senhor. Para que Jonas abandonasse seus próprios planos teimosos e se voltasse para Deus como sua esperança, ele precisava primeiro cair de joelhos. Lemos na Bíblia: “Humilhai-vos, (…), sob a poderosa mão de Deus, para que ele, em tempo oportuno, vos exalte” (1Pe 5.6).
- Os maravilhosos propósitos de salvação
No entanto, não gostamos de nos humilhar diante de Deus, por isso ele, em sua graça, faz isso por nós, por causa do seu maravilhoso propósito da salvação. Como isso se aplica àqueles que se encontram numa situação desesperadora sem culpa própria evidente? Como isso se aplica à mulher que se desesperou com Deus por causa da doença de sua filha? A resposta nada mais é do que uma variação do tema de Jonas. A fim de podermos nos voltar para Deus de verdade, precisamos aceitar e experimentar que Deus é soberano. Ele é também santo, justo e bom. Precisamos reconhecer e experimentar que Deus é o Senhor soberano e salvador. Jonas sabia da doutrina da Soberania divina, mas não a havia experimentado. Por isso assim como Jonas teve que se curvar diante do chamado soberano de Deus em seu ministério, precisamos nos curvar também diante do propósito soberano de Deus em nossas circunstâncias. Em muitos casos, Deus nos chama para o arrependimento de algum pecado evidente. Em outros, Deus está nos preparando para um CHAMADO ou PROVAÇÃO. Em ambos os casos, Deus nos humilha para encontrarmos o senso correto de adoração e de confiança em sua graça. Ele diz: “… eu sou Deus, e não há outro” (Is 45.22; 46.9).
Portanto, encontramos nossa resposta em primeiro lugar reconhecendo a soberania santa, justa e bondosa de Deus em todos os nossos chamados e, em segundo lugar, voltando-nos para aquele que é o único capaz de nos salvar. No fim, Jonas se arrepende e ora não só por causa de seu conhecimento da soberania ou da santidade de Deus. É a lembrança da GRAÇA DE DEUS que faz seu coração se voltar para o Senhor. “Então, eu disse: lançado estou de diante dos teus olhos”, (v.4). Esse é o reconhecimento do profeta da presença da justa ira de Deus em sua vida. Mas então ele acrescenta: “tornarei, porventura, a ver o teu santo templo?” (Jn 2.4). Aqui, Jonas se lembra da GRAÇA MISERICORDIOSA DE DEUS, e é com essa confiança renovada na graça de Deus que Jonas se vê motivado a orar mais uma vez. Quando chegamos ao ponto em que nos entregamos ao Deus vivo e verdadeiro, o resultado é sempre o mesmo: NÓS ORAMOS. Buscamos seu poder e sua misericórdia para a nossa salvação. Mais tarde, poderemos dizer: “Na minha angústia, clamei ao Senhor, e ele me respondeu; do ventre do abismo, gritei, e tu me ouviste a voz” (Jn 2.2).
- O SALMO DE JONAS
Isso, porém, levanta uma pergunta importante: como Jonas se lembrou da graça maravilhosa de Deus? Já falamos sobre QUANDO Jonas se lembrou da graça de Deus de forma que voltasse a orar: foi na reta final dentro do grande peixe nas profundezas. Mas COMO Jonas se lembrou da graça de Deus? Como ele pode orar tão biblicamente?
- Alimentado pelos Salmos.
Imaginemos tirando a oração do livro de Jonas e lendo-a separadamente. Que livro da Bíblia acreditaríamos estar lendo? Existe uma resposta que todos que conhecem a Bíblia dirão: o livro de Salmos. Talvez diríamos: “Mas que salmo é esse? Eu deveria conhecer esse salmo!”. Na verdade, Jonas não está citando nenhum salmo específico, mas recitando os temas dos salmos em geral. Um estudo da oração de Jonas revelará alusões ou referências aos salmos 3, 5, 16, 18, 31, 42, 50, 65, 88 e 120. Toda a perspectiva dos salmos — sobre Deus e o homem, sobre a vida e a morte, sobre o desespero e a esperança, sobre o medo e a fé — flui pelo coração e pela boca de Jonas. Então, como é que, de repente, Jonas se transforma em um grande teólogo dos Salmos na barriga do grande peixe? A única resposta possível é que ele foi criado e alimentado com os salmos. Ele recitou e cantou os salmos durante toda a sua vida. Os salmos estavam dentro dele porque havia vivido no meio do povo de Deus. Agora, nessa SITUAÇÃO EXTREMA sob as ondas e dentro de um grande peixe, quando Jonas sente o desejo de orar, o vocabulário e a fé dos salmos se expressam em sua oração.
Essa é a melhor e mais forte propaganda possível para o valor do livro de Salmos. Veja a importância do nosso devocional McCheyne, onde lemos os salmos duas vezes por ano. Nos salmos da Bíblia, por meio do milagre da inspiração, Deus coloca nos lábios dos seus adoradores as palavras de fé, adoração e vida. Nos salmos, encontramos o ser humano em todas as circunstâncias — frequentemente de necessidade e desespero — olhando para Deus em busca de fé. Nos salmos, lemos exatamente as mesmas queixas que fazemos em nossos próprios corações e encontramos neles também o remédio para essas queixas, por meio de uma nova compreensão da glória e da graça de Deus. Os salmos abordam cada emoção humana, com cada experiência humana, com todos os altos e baixos, e tudo isso de forma que restaura a fé do fiel em Deus.
Dessa forma, os salmos apresentam a doutrina da salvação na luta e na experiência vivida. Eles apresentam as verdades salvíficas da Palavra de Deus como uma luz na neblina da luta humana para restaurar a visão do céu. São, talvez, a melhor resposta à notável oração oferecida a Jesus: “Eu creio! Ajuda-me na minha falta de fé” (Mc 9.24). Por essas razões, a longa experiência de Jonas com os salmos resulta na maior ajuda em sua mais escura hora de necessidade: sua mente retorna para o Senhor, e seu coração se refresca na graça de Deus. Cristãos que tem o hábito de ler os salmos, que cantam os salmos e os aprendem de cor, são ricamente recompensados em suas horas de escuridão, de dúvida e desespero.Podem orar com as palavras perfeitas para sua situação difícil, com palavras que tomam sua fé fraca pela mão e a levam novamente até o Senhor.
- Experimentando a graça da Palavra.
É claro que poderíamos dizer o mesmo sobre toda a Bíblia. Aqui, mais uma vez, Jonas nos oferece uma lição. Seu livro começa com um chamado difícil de Deus. A fé de Jonas é abalada pelo chamado de pregar em Nínive. O pecado oculto que habita em seu coração, que é o ódio contra os ninivitas, o faz fugir da presença do Senhor. Em vez de orar, Jonas tampa seus ouvidos e foge da influência da Palavra de Deus. Ele encontra a solução para o seu desespero no navio a caminho de Társis. Para não ouvir a Palavra de Deus. E quantas VERSÕES MODERNAS existem desse navio a caminho de Társis, às quais os cristãos embarcam em seu conflito com as ordens de Deus em sua Palavra! Quantos de nós não estamos embarcando em alguma VERSÃO MODERNA, a caminho de Társis. Társis, era o fim do mundo. Terra do sucesso e das oportunidades. Lugar de riquezas, ouro e prata. Um ótimo lugar para recomeçar, cheio de facilidades e oportunidades, embora fosse uma viagem muito perigosa. Társis, é o oposto do difícil CHAMADO DE DEUS, onde vamos precisar lidar com os nossos desafetos, trabalhar nossos orgulhos e a amargura, lidar com pessoas difíceis e que nos causará muitos males e sofrimento.
Quantas igrejas recuam hoje diante do DIFÍCIL CHAMADO À FIDELIDADE embarcando em navios a caminho de Társis; que são substitutos mundanos para o ministério da Palavra de Deus, convenientemente e facilmente colocados à nossa disposição por nosso inimigo, o diabo. No entanto, a resposta verdadeira à nossa necessidade e ao nosso desespero se encontra na Bíblia. É apenas quando voltam a sentir a “influência de Deus” que cristãos parecidos com Jonas são restaurados no arrependimento. É a influência da Palavra de Deus que volta nosso coração para Deus em oração, em vez de afastá-lo de Deus em navios a caminho de Társis.
Portanto, tanto na experiência do indivíduo quanto na vida da igreja, sempre é verdade que “… a fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo” (Rm 10.17). A maneira de experimentar a graça de Deus é voltar-se para a Palavra de Deus. Foi assim que Pedro falou sobre a conversão de pecadores para a fé salvífica: “… fostes regenerados […] mediante a palavra de Deus, a qual vive e é permanente” (1 Pe 1.23). Jesus falou assim sobre a graça de Deus para o crescimento e a restauração daqueles que já foram salvos: “Santifica-os na verdade“, ele orou, “a tua palavra é a verdade” (Jo 17.17). Não importa se estamos sendo humilhados diante de Deus pela primeira ou a milésima vez, ou se estamos sendo levados mais uma vez a visitar à escuridão condenadora da barriga do peixe, a graça de Deus da qual necessitamos é encontrada e vivenciada por meio da Palavra de Deus.
III. A ORAÇÃO DE JONAS PELA LIBERTAÇÃO
Em quê, “O QUÊ” exatamente, Jonas estava confiando quando ele se voltou novamente para Deus em oração? Já falamos sobre o “QUANDO” da oração de Jonas: ele orou quando Deus o lançou na escuridão. Estudamos o “COMO” da oração de Jonas: ele orou lembrando-se do Senhor, quando a graça de Deus o lembrou dos salmos. Agora, falta explicar “O QUE” da oração de Jonas. O que ele pediu em sua oração? O que ele buscou em sua oração das profundezas? Qual seria o tipo de oração que faríamos. A oração de Jonas se concentra num único tema, introduzido já no início, isto é, a resposta misericordiosa de Deus em sua necessidade: “Na minha angústia, clamei ao Senhor, e ele me respondeu; do ventre do abismo, gritei, e tu me ouviste a voz” (Jn 2.2). Ele chegou a essa compreensão reconhecendo em três passos: primeiro reconhecendo sua situação verdadeira; em segundo lugar, lembrando-se de seu relacionamento com o Senhor; em terceiro lugar, apelando à providência graciosa de Deus para pecadores como ele. Vejamos:
- Reconhecendo sua situação desesperadora.
Primeiro, Jonas descreve sua situação desesperadora na barriga do grande peixe. Ele estava em “angústia” (Jn 2.2). Ele estava no “ventre do abismo“, ou seja, ele acreditava encontrar-se num túmulo infernal. “… a corrente das águas me cercou” (v. 3), ele escreve, lembrando-nos dos salmos que falam das dificuldades que se erguem como uma enchente, mas no caso de Jonas isso já não era uma metáfora. Aqui, Jonas entendeu que estava morrendo: “… desfalecia a minha alma” (Jn 2.7). E sua situação era verdadeiramente miserável: “… as algas se enrolaram na minha cabeça. Desci até aos fundamentos dos montes, desci até à terra, cujos ferrolhos se correram sobre mim, para sempre” (Jn 2.5-6). Jonas via seu peixe como prisão com grades intransponíveis. Essa é uma versão dramática do tipo de situação em que o pecado e a tolice nos lançam. Constantemente passamos pela situação exata de Jonas, e sentimos as mesmas emoções por razões diferentes. Para alguns, é sua CARREIRA PROFISSIONAL que os levou ao desespero. Para outros, é um RELACIONAMENTO RUIM que semeou destruição em sua vida. Algumas pessoas experimentam isso por meio de TOLICES FINANCEIRAS; o peso de suas dívidas lhes parece uma prisão. Outros foram alimentando a AMARGURA, se opondo, crendo em mentiras, e acabam numa prisão existencial. Mas o pior aos olhos de Jonas era que ele estava separado de Deus: “Então, eu disse: lançado estou de diante dos teus olhos” (Jn 2.4). Era justamente isso que ele pretendera com sua fuga do Senhor. Mas agora ele havia provado o gosto de sua rebelião contra Deus, toda a amargura de sua situação sem saída sufocava sua alma. Preso no peixe, Jonas havia chegado ao fim. Esse reconhecimento de sua situação verdadeira foi o ponto de virada na vida de Jonas. Isso ocorre com frequência também em nossa experiência: apenas quando vemos a profundeza da nossa queda é que estamos prontos para buscar o caminho da libertação oferecido por Deus.
- Ele se lembrou de seu relacionamento com Deus.
Jonas reconheceu a tolice de seu pecado. Ele percebeu sua necessidade do Senhor. Como então ele poderia ser restaurado? A resposta se manifesta no restante dessa oração. Lemos que “Jonas orou ao Senhor” (Jn 2.1). Após ter reconhecido sua situação verdadeira, Jonas se lembrou de seu relacionamento com Deus. O tempo todo ele havia sido um homem em aliança com Deus. Ele acreditava em Deus, e Yahweh era seu Deus. Isso torna sua rebelião ainda mais tola, mas também demarca o inicio de sua esperança. Ele sabia que estava separado de Deus em sua descrença e em suas circunstâncias. O Senhor o havia afastado de sua visão (Jn 2.4). Mas aquilo que ele sabia sobre o Senhor o lembrou de que havia um caminho de esperança. A promessa da graça de Deus permanecia a despeito da tolice de Jonas no pecado.
Ele havia abandonado Deus, mas o fato de que ele ainda não havia se afogado provava que Deus não o havia abandonado. Em tempos de desespero, cada cristão deveria se lembrar da promessa de Deus de que ele jamais abandonará seu povo. Deus disse: “De maneira alguma te deixarei, nunca jamais te abandonarei” (Hb 13.5). A lembrança da fidelidade de Deus em misericórdia, recebida exclusivamente por meio da fé, transformou a petição de Jonas em louvor. É isso que os críticos liberais de Jonas não conseguem entender. Agora, ele confia na salvação de Deus. Isso é notável, pois em momento algum lemos que Jonas pediu a Deus que fosse liberto do peixe. No entanto, ele exulta: “Na minha angústia, clamei ao Senhor, e ele me respondeu; do ventre do abismo, gritei, e tu me ouviste a voz” (Jn 2.2). Este é o sinal de que somos restaurados à fé: enquanto conhecermos o favor do Senhor, não precisaremos ser libertos das nossas provações. Como Jonas sabia que Deus o havia ouvido e respondido à sua oração? A resposta é que ele se arrependeu e creu. No (v.7) ele diz que se “lembra do Senhor” e sua oração é respondida. Quando reconhecemos humildemente a nossa indignidade e nosso pecado e o louvamos por seu amor fiel é prova de que Deus está presente para salvar-nos.
Jonas faz uma analogia entre sua situação real e a sua situação espiritual em que ele estava desde o dia que decidiu fugir: “Desci até aos fundamentos dos montes, desci até à terra, cujos ferrolhos se correram sobre mim, para sempre; contudo, fizeste subir da sepultura a minha vida, ó Senhor, meu Deus!” (Jn 2.6). Sua prisão verdadeira eram sua DESCRENÇA e seu RESSENTIMENTO em relação a Deus, nos quais ele sofreu em escuridão; o estômago do grande peixe era apenas a analogia. Deus o libertou restaurando sua fé, e isso era tudo que Jonas precisava para saber que ele seria completamente restaurado. “Quando, dentro de mim, desfalecia a minha alma, eu me lembrei do Senhor; e subiu a ti a minha oração, no teu santo templo” (Jn 2.7). O fato de ele se lembrar de Deus como Salvador bastou para assegurá-lo da certeza de sua salvação. Devemos perceber que nossa fé em Cristo testifica a obra de salvação de Deus em nossa vida. Sabemos que estamos seguros mesmo em momentos das mais escuras provações.
- O apelo a graça de Deus.
O terceiro aspecto da oração de Jonas é seu apelo à graça de Deus para os pecadores. Jonas não só recuperou uma confiança na misericórdia de Deus, mas lembrou-se também da provisão que Deus fez para a salvação de pessoas como ele. Esse foco é evidente em sua oração: “… lançado estou de diante dos teus olhos; tornarei, porventura, a ver o teu santo templo?” (Jn 2.4). Por que Jonas pensou no templo de Deus? No (v.4) “… tornarei, porventura, a ver o teu santo templo”. E no (v.7) “… subiu a ti a minha oração, no teu santo templo”. Jonas pensou porque Deus havia colocado ali o seu nome. Porque o templo era o símbolo da presença divina. Onde sua graça e misericórdia era visivelmente manifestada através do sangue da propiciação pelos pecados. Jonas se lembrou de que Deus havia ordenado sacrifícios como forma de restaurar os pecadores. Era em virtude desses sacrifícios que o templo existia, para que o sangue dos carneiros fosse derramado pelo perdão dos pecados. E foi pela misericórdia de Deus, por meio do sangue do sacrifício, que Jonas tinha a esperança da salvação. A oração de Jonas serve como modelo para nossa própria oração por salvação. Pois aquilo para o que Jonas olhou em fé se cumpriu em Jesus Cristo.
Cada um de nós, não importa quão fundo caímos, pode olhar para o altar no qual o Cordeiro foi morto para a reconciliação com Deus. Cada um de nós, não importa quão escuras sejam as circunstâncias, pode olhar para a cruz de Cristo como prova do amor eterno de Deus. O apóstolo João escreveu: “Se todavia (…), alguém pecar, temos Advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo; e ele é a propiciação pelos nossos pecados” (1Jo 2.1-2). Paulo acrescentou: “Se Deus é por nós, quem será contra nós? Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura, não nos dará graciosamente com ele todas as (Rm 8.31-32). Isso significa que independente das provações ou os sofrimentos que experimentamos nesta vida seja por causa de nossos pecados ou não, os cristãos podem encontrar na cruz todas as provas necessárias do amor con-quistador de Deus, do amor santo de Deus, do amor providencial de Deus, do amor eterno de Deus. Com a cruz em mente, o escritor de Hebreus nos incentiva: “Acheguemo-nos, portanto (…), confiadamente, junto ao trono da graça, a fim de recebermos misericórdia e acharmos graça para socorro em ocasião oportuna” (Hb 4.16).
CONCLUSÃO
Reconhecendo o perigo em que ele havia caído por causa do seu pecado, lembrando-se da fidelidade de Deus ele apelou à graça salvadora por meio do sangue de Cristo. Jonas concluiu sua oração com uma grande exclamação, que tem encorajado multidões do povo de Deus: “Ao Senhor pertence a salvação!” (Jn 2.9). Que verdade extraordinária, Deus tem prazer em salvar. Essa oração de Jonas é de natureza profundamente pessoal; não há dúvida de que Jonas chegou a uma conclusão surpreendente que transformou sua atitude diante de tudo em sua vida. Jonas entendeu então que Deus o havia lançado na escuridão profunda, nesse grande peixe, não para destruí-lo, mas para salvá-lo. Devemos reconhecer o propósito divino de salvação quando refletirmos sobre sua providência em nossa vida? DEUS NÃO ESTÁ DESTRUINDO VOCÊ EM SUAS PROVAÇÕES. O SENHOR ESTÁ SALVANDO VOCÊ. Deus está nos restaurando da nossa rebelião pecaminosa, da AUTOCONFIANÇA TOLA, do nosso ORGULHO IGNORANTE e da nossa TEIMOSIA DESCRENTE, e da nossa AMARGURA OPOSITORA. Todos nós tendemos naturalmente a agir assim devido a nossa condição caída, por isso precisamos aprender a nos voltar para ele em busca de graça. Cada cristão é convidado a aprender a oração de Jonas, para que todos nós possamos regozijar juntamente com o profeta: “Na minha angústia, clamei ao Senhor, e ele me respondeu […]. Ao Senhor pertence a salvação!” (Jn 2.2,9).